sábado, 9 de julho de 2016

O Argueiro e a Trave no Olho


POR DOUGLAS RAINHO

Por que vês tu, pois, o argueiro no olho do teu irmão, e não vês a trave no teu olho? Ou como dizes a teu irmão: Deixa-me tirar-te do teu olho o argueiro, quando tens no teu uma trave? Hipócrita, tira primeira a trave do teu olho, e então verás como hás de tirar o argueiro do olho de teu irmão. (Mateus, VII: 3-5).

 Um dos caprichos da humanidade é ver cada qual o mal alheio antes do próprio. Para julgar-se a si mesmo, seria necessário poder mirar-se num espelho, transportar-se de qualquer maneira fora de si mesmo, e considerar-se como outra pessoa, perguntando: Que pensaria eu, se visse alguém fazendo o que faço? É o orgulho, incontestavelmente, o que leva o homem a disfarçar os seus próprios defeitos, tanto morais como físicos. Esse capricho é essencialmente contrário à caridade, pois a verdadeira caridade é modesta, simples e indulgente. A caridade orgulhosa

é um contra senso, pois esses dois sentimentos se neutralizam mutuamente. Como, de fato, um homem bastante fútil para crer na importância de sua personalidade e na supremacia de suas qualidades, poderia ter ao mesmo tempo, bastante abnegação para ressaltar nos outros o bem que poderia eclipsá-lo, em lugar do mal que poderia pô-lo em destaque? Se o orgulho é a fonte de muitos vícios, é também a negação de muitas virtudes. Encontramo-lo no fundo e como móvel de quase todas as ações. Foi por isso que Jesus se empenhou em combatê-lo, como o principal obstáculo ao progresso.

Evangelho Segundo o Espiritismo


Já diz o velho adágio popular: “Quando aponta um dedo para alguém, mais três se voltam contra ti.”

Com essa máxima e o auxílio da moral de Cristo na parábola do Argueiro e da Trave, associada as explicações do Evangelho Segundo o Espiritismo, podemos fazer uma grande reflexão. Qual de nós não aponta os defeitos dos outros sem nem ao menos nos preocuparmos com os nossos. Além disto, como podemos querer que alguém seja diferente do que é, se nós mesmos não somos?

Muitas vezes culpamos as pessoas pelas nossas próprias frustrações e medos. Tendenciosos como somos, queremos sempre analisar o mundo por meio de nossa ótica, não explorando as diversas facetas do que pode ocorrer. Alguém que é sincero consigo mesmo é raro e, por vezes, sempre é imputado de alcunhas que não são verdadeiras: Prepotência, Arrogância, Antipatia, entre outras. Simplesmente porque o mesmo é fiel as suas convicções e prefere se manter centrado em suas aspirações e ideais.

Ainda pior é quando apontamos um “defeito” em alguém, uma característica sua, defendendo que deve ser mudada. Mas a mesma característica é presente dentro de ti ou de alguém próximo e você a defende. É o mote dos pesos e medidas diferentes para a mesma coisa.

Devemos parar com a insípida tentativa de ser o que não somos e terminar por vez de tentar mudar o outro, sendo que nem a nós mesmos conseguimos mudar. Se algo lhe incomoda em alguém é porque você não tem ainda maturidade espiritual e moral para trabalhar com isso e aceitar. Se fôssemos tão elevados como achamos que somos, aceitaríamos os irmãos em suas dificuldades e com todos seus defeitos. A compreensão é importante, mesmo que ele tenha um vício grave de caráter, ainda devemos compreender, aceitá-lo como é e trabalhar para que ele se ajude. Mas nunca devemos impor o que achamos sem nem ao menos tentar mudar o que nós mesmos temos de errado.

Friso muito essa questão do EU, pois estamos cheios de Messias, Santos e Doutores da Lei encarnados tentando dizer como viver, para o que viver e como fazer. Um grande amigo espiritual me disse certa vez: “Quando você desencarnar, a primeira pergunta que lhe farão é: O que você fez por você?”. Vê como dá pra refletir nessa pergunta?

Jesus em sua imensa sabedoria usa da figura do conto para mostrar que um irmão está apontando uma pequena farpa enquanto quem aponta tem toda uma árvore tapando sua visão.

Argueiro, segundo o dicionário significa:

s.m. Palhinha, grânulo, cisco; partícula separada de qualquer corpo.
Fig. Coisa sem importância, ninharia.

Ainda assim podemos nessa implicância com o outro estar exaltando a nossa sombra. Segundo Carl Jung:

“Sombra é a coisa que uma pessoa não tem desejo de ser.”

Jung afirma que a sombra é o lado negativo da nossa personalidade, é o conjunto de todas as más qualidade que desejamos esconder, inclusive de nós mesmos. Mas que sempre é evidenciada quando a vemos num terceiro. Eu vejo praticamente como uma forma de exorcismo dos nossos maus hábitos, pois para não sofrermos a tentação de agir de tal forma ou de trazer a tona certas qualidade desagradáveis, acabamos também por querer eliminar todo e qualquer contato com ela, mesmo que num terceiro. É o ato de julgar o próximo.

E não adianta se achar santo, se você está encarnado, com toda certeza têm débitos pretéritos. Jung define isso como a sombra que carregamos, como a qualidade que nos faz humanos. Os Anjos e Santos (como espíritos superiores, e não a figura mitológica) não precisam de sombra pois já abdicaram de todos seus males e defeitos. E ainda reforço com as conjecturas do pensador alemão: Quanto menos a aceitamos, mais densa e negra ela se torna.

Para livrar-se da sombra é necessário aceitá-la primeiramente. Então na próxima vez que formos apontar o dedo em direção a um irmão, pensemos muito, pois só com a reflexão é que poderemos extirpar o mal que nos assola e que acabamos projetando e vendo em todos ao nosso redor.

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