sábado, 9 de julho de 2016

Não julgueis a fim de que não sejais julgados

Não julgueis a fim de que não sejais julgados

Escrito por Maria Antonia Paduan

A condição de “ser com capacidade pensante”, nos coloca naturalmente na condição de uso do livre arbítrio e consequentemente como observador e juiz nas relações sociais e diante dos acontecimentos da vida. Se assim não fosse estaríamos em constante risco e a sociedade não teria regras para estabelecer os limites que favorecem a harmonia e a boa convivência. Portanto, o julgamento é necessário ainda, numa sociedade que caminha a passos lentos para a evolução. Dele, então, derivou um corpo de conhecimento – a Justiça - que estabelece os limites de ação, que cerceia o mal e torna as medidas de avaliação de atitude equilibrada para todos, e estabelece sansões, a fim de garantir a ordem no funcionamento social.

Continuamente, no dia a dia, avaliamos fatos, pessoas, condições, etc. A partir disto estabelecemos um julgamento de valores como: bom ou ruim; certo ou errado, com base na bagagem de vida adquirida no passado (encarnações anteriores) e por meio das experiências da infância, adolescência e do presente. Essa bagagem forma uma espécie de “reservatório moral”, conforme refere Hammed, na obra Renovando Atitudes.

Esse reservatório é nosso guia diante dos fatos e pessoas que julgamos. Cita o autor “em razão disso, os freqüentes julgamentos que fazemos em relação às outras pessoas nos informam sobre tudo aquilo que temos por dentro". Explicando melhor, “a forma e o material utilizados para sentenciar os outros residem dentro de nós.”

Julgar é, portanto, um ato de avaliar, criticar, de ponderar, estabelecer juízo de valores com o fito de buscar a justiça ou fazer escolhas.

No entanto, é preciso entender a que julgamento Jesus se referia conforme citado em Mateus capítulo VII, v. 1 e 2 - “Não julgueis a fim de que não sejais julgados; porque vós sereis julgados segundo houverdes julgados os outros; e se servirá para convosco da mesma medida da qual vos servistes para com eles”.

No Evangelho segundo o Espiritismo vamos encontrar clara explicação a respeito dessa recomendação de Jesus, no seguinte texto:

“A censura de conduta alheia pode ter dois motivos: reprimir o mal, ou desacreditar a pessoa cujos atos criticamos. Este último motivo jamais tem escusa, pois decorre da maledicência e da maldade. O primeiro pode ser louvável, e torna-se mesmo um dever em certos casos, pois dele pode resultar um bem, e porque sem ele o mal jamais será reprimido na sociedade.”

Em João, VIII: v. 3-11: “Então lhe trouxeram os escribas e os fariseus uma mulher que fora apanhada em adultério, e a puseram no meio, e lhe disseram: Mestre, esta mulher foi agora mesmo apanhada em adultério; e Moisés, na Lei, mandou apedrejar a estas tais. Qual é a vossa opinião sobre isto?...: Jesus lhes respondeu Aquele dentre vós que estiver sem pecado atire-lhe a primeira pedra... Então, erguendo-se, Jesus lhe disse: Mulher, onde estão os que te acusavam? Ninguém te condenou? Respondeu ela: Ninguém, Senhor. Então Jesus lhe disse: Nem eu tampouco te condenarei; vai, e não peques mais”.

Jesus manifesta claramente seus objetivos ao aproveitar cada momento e fato da época para ensinar ao seu povo a reflexão e a revisão das atitudes, bem como a necessidade de atualizar as regras da justiça social vigente.

Sua proposta era:
- reflexão sobre o modo de pensar da época - revisão de valores sociais e das próprias leis mosaicas vigentes (Olho por olho, dente por dente)
- uma ação de amor e não de condenação em relação ao próximo
- a auto avaliação como forma de melhorar-se.

Daí seus ensinamentos ultrapassarem os séculos e se manterem atualizados, servindo de código de conduta para cada um de nós, ainda hoje.

Como, então, atingir a proposta do Mestre?

Prestar atenção na forma como pensamos, que valores adotamos para guiar nossas atitudes e como agimos diariamente, pois a maledicência e a maldade revelam nossa imperfeição; daí a necessidade de atentarmos de como andam nossas atitudes. O tema nos fala sobre a importância de não julgarmos precipitadamente as criaturas e, conseqüentemente, não atirarmos a primeira pedra naqueles que nos parecem errados.

Muitas vezes, somos benevolentes para com os nossos erros e muito severos para com os erros dos outros. Temos um exemplo:

Todos os dias, Dona Maria olhava pela janela de sua cozinha em direção ao varal de roupas na casa de sua vizinha e comentava com a família:

- Nossa! Como os lençóis daquela mulher estão sujos!
No dia seguinte, novamente na cozinha e olhando mais uma vez para a sua vizinha, que estendia as roupas, Dona Maria comentava:

- Não sei como ela não tem vergonha de colocar aquelas roupas imundas no varal!

E era assim todos os dias. Dona Maria já estava habituada a olhar para o varal da vizinha e criticá-la por tanta roupa suja. Até que, um dia, não suportando mais ver aquilo, decidiu que iria chamar a atenção da vizinha.

Ao vê-la estendendo seus lençóis, correu na direção da janela da cozinha. Mas, para a sua surpresa, Dona Maria descobriu que a sua janela estava emperrada. E notou também que, ao tentar abri-la, os vidros ficavam com as marcas de sua mão. Desesperada, pegou um pano e começou a limpar os vidros. O pano ficou coberto de sujeira. Após encerrar a limpeza, ao olhar novamente para o varal da vizinha, pode ver que todas as roupas estendidas estavam limpas, alvas.

Só então percebeu que, na realidade, o que estava sujo não eram as roupas da vizinha, e sim a sua vidraça.

Na maior parte do tempo estamos observando e julgando, e quase sempre errando, porque não usamos a mesma medida para avaliar os outros que gostaríamos que usassem para nos avaliar. É necessário que sejamos mais benevolentes, retiremos a trave dos nossos olhos e não critiquemos a dos olhos dos outros.

Hammed nos propõe “Melhor do que medir ou apontar o comportamento de alguém seria tomarmos a decisão de visualizar bem fundo nossa intimidade. Os indivíduos podem ser considerados, nesses casos, excelente espelho, no qual veremos quem somos realmente”.

Afirma ele “só poderemos nos reabilitar ou reformar até onde conseguimos nos perceber; ou seja, aquilo que não está consciente em nós dificilmente conseguiremos reparar ou modificar”.

Quando não nos observamos, corremos o risco de cometermos erros, injustiças, atitudes incorretas e precipitadas, complicando nossa evolução devido aos nossos mecanismos de defesa – “processos mentais inconscientes que possibilitam ao indivíduo manter sua integridade psicológica através de uma forma – o auto-engano”.

Muitas vezes, as pessoas por não conseguirem conviver com a verdade, tentam sufocar ou enclausurar seus sentimentos e emoções no inconsciente, disfarçando-os.

Em todo comportamento humano existe uma lógica, isto é, uma maneira particular de raciocinar sobre sua verdade; portanto, julgar, medir e sentenciar os outros, não se levando em conta suas realidades, mesmo sendo consideradas preconceituosas, neuróticas ou psicóticas, é não ter bom senso ou racionalidade, pois na vida somente é válido e possível o ―auto-julgamento, afirma o autor.

Outro aspecto importante do julgamento a ser apontado é o que se julga. Julgar uma ação é diferente de julgar a criatura. Podemos julgar e considerar a prostituição moralmente errada, mas não podemos e não devemos julgar a pessoa prostituída. Ao usarmos da empatia, colocando-nos no lugar do outro, ― sentindo e pensando com ele, em vez de ― pensar a respeito dele, teremos o comportamento ideal diante dos atos e atitudes das pessoas, refere Hammed.

Como forma de melhor os vigiarmos neste aspecto devemos adotar a auto-avaliação e a meditação como importantes ferramentas de uso diário a fim de sairmos desse padrão contínuo de desacertados julgamentos.

Lembrar também que “o ser humano é um verdadeiro campo magnético. Atrai pessoas e situações, criando sintonias tanto positivas como negativas.” Se observarmos os acontecimentos e os fatos da nossa vida, e dos outros, vamos perceber que muitos deles são repetitivos. Quando adentramos num ambiente somos capazes de realizar uma leitura sensitiva daquele ambiente. O modo de ser e de agir de grupos revela sua liderança, pelo modo como o ambiente deste grupo se revela. Isto se chama sintonia, determinada pelo campo magnético de cada um.

De forma muito elucidativa Hammed diz “nossas afirmações prescreverão as águas por onde a embarcação de nossa vida deverá navegar”.

Segundo Paulo de Tarso, ―é indesculpável o homem, quem quer que seja, que se arvora em ser juiz. Porque julgando os outros, ele condena a si mesmo, pois praticará as mesmas coisas, atraindo-as para si, com seu julgamento.

Portanto, nossos julgamentos serão sempre os motivos de nossa liberdade ou de nossa prisão no processo de desenvolvimento e crescimento espiritual.

Não julgueis para não serdes julgados, propõe a mudança e melhora íntima, através da busca da melhoria diária.

Sócrates sabiamente enfatizou essa atitude quando propôs “Conhece-te a ti mesmo”, que nada mais é que o trabalho de auto-análise, de mergulho no Eu, a fim de identificarmos a nossa realidade íntima e corrigi-la dia a dia pelo esforço da renovação da atitude e não autopunição. Temos que ter o cuidado para não nos acharmos a última das criaturas após a identificação dos erros e evitar extremos. Antes, éramos o máximo, e após a conscientização, passamos a nos considerar as últimas criaturas. O Equilíbrio se faz necessário e deve ser o norteador de nossa conduta.

Bibliografia: O Evangelho segundo o Espiritismo – Allan Kardec - tradução de Salvador Gentile – Editora IDEAl, 315a. edição, 2005 – SP.
Renovando Atitudes – Francisco do Espírito Santo – ditado pelo espírito de Hammed, capitulo 10, item 1, pg 11. Editora Boa Nova, 1997 - SP.
Site: http://www.espirito.org.br/portal/palestras/irc-espiritismo/estudos-espiritas

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