domingo, 21 de novembro de 2010

AS MULHERES E JESUS - Simonetti



Dando seqüência à divulgação da Boa Nova, Jesus viajava bastante. Desdobrava suas atividades pelas cidades da Galiléia. Estagiava cada vez menos em Cafarnaum. Além dos apóstolos, outros aprendizes o acompanhavam. 

Havia, ainda, importante grupo que, em face das próprias tradições judaicas, não aparece com destaque nos Evangelhos.

As mulheres:

A participação feminina contrariava os costumes da época. 
Anonimato e a subalternidade lhes eram impostos.
Algumas dessas colaboradoras, segundo Lucas, haviam sido curadas de Espíritos malignos e de enfermidades.

Possuíam, sem dúvida, faculdades mediúnicas. 
Não sabendo lidar com a própria sensibilidade, eram influenciadas por entidades perturbadas e perturbadoras.

Jesus não só as libertara como lhes ensinara o recurso maior para que se conservassem saudáveis, física e psiquicamente:

Servir à causa evangélica.
Quem o faz com dedicação e perseverança, sustenta padrão vibratório elevado, inacessível às sombras.

Lucas cita três mulheres, participantes do grupo:

• Maria de Magdala (Madalena) 
Magdala é o nome de pequena cidade de onde viera, usado como cognome para distingui-la das outras Marias que aparecem na narrativa evangélica. Sofrera a influência Espíritos impuros, afastados por Jesus. 

Diz Lucas, textualmente, que: dela saíram sete demônios.

Segundo crenças antigas, demônios eram entidades que presidiam os destinos humanos, individual e coletivamente. Para os judeus eram almas dos mortos, quando se comprometiam com o mal.

Na Idade Média adotou-se a idéia de que são anjos rebelados contra Deus, que pretendem impor seu domínio sobre os homens.
Há um equívoco na informação de que os demônios saíram dela. 

Seria, sem dúvida, problemático, imaginar tantos Espíritos instalados no corpo de alguém, como invasores de uma residência. 

Mesmo na chamada subjugação, em que há domínio completo, os obsessores não substituem o obsidiado na máquina física, nem coabitam com ele. Apenas impõem sua vontade, induzindo-o a fazer o que não deseja.

Tantos Espíritos juntos passam idéia de uma equipe organizada para atormentá-la, provavelmente exercitando vingança.

A jovem de Magdala tem sido apresentada como símbolo da meretriz arrependida, que se encantou com os ensinamentos de Jesus e modificou os rumos de sua vida, tornando-se ardorosa discípula.

Será?

Não há nenhuma referência ao seu suposto envolvimento com a prostituição. Essa interpretação equivocada inspira-se no fato de Lucas a apresentar logo após o episódio da pecadora que ungiu os pés de Jesus.

Analisando o texto evangélico, temos uma única certeza:
Maria de Magdala foi curada de uma obsessão.
Situá-la como mundana convertida é exercício de imaginação. 

• Joana. 
Esposa de Cuza, procurador de Herodes.
Segundo Humberto de Campos, no livro Boa Nova, psicografia de Chico Xavier, foi ardorosa discípula de Jesus, de quem recebeu sábios conselhos para lidar com seu marido, homem rico, envolvido com tricas da política e vida desregrada.

Após sua morte, Joana dedicou-se aos labores evangélicos e teria sido martirizada no circo romano, em glorioso testemunho de suas convicções.

• Suzana.
Nada sabemos dela. 
Lucas limita-se a enunciar seu nome.

O evangelista observa que havia mais mulheres, sem citá-las nominalmente. 
Apenas revela que eram muitas e que colaboravam financeiramente.

Destacam-se, ainda, nos Evangelhos:

• Maria, esposa de Alfeu. 
- Mãe do apóstolo Tiago Menor. 
• Maria de Betânia.
- Irmã de Marta e Lázaro, este o célebre “ressuscitado”. 
• Salomé.
- Esposa de Zebedeu, mãe de Tiago Maior e João.

Há várias passagens evangélicas em que Jesus liberta homens de Espíritos obsessores. Não vemos os beneficiários dessas curas participando do movimento.

Entre as mulheres, havia inúmeras.
Esse fenômeno é comum. Está presente em todas as religiões. 

No Centro Espírita é mais expressivo o contingente de mulheres que freqüentam as reuniões e participam de suas atividades.

Um amigo, machista incorrigível, explica:
– Questão de necessidade. A mulher é mais carente, mais frágil, espiritualmente.
Opinião distanciada da realidade.

A alma feminina é mais sensível aos valores espirituais, mais disposta aos testemunhos da fé. O Homem tende ao materialismo, à preocupação com os negócios. Envolve-se tanto que não encontra tempo nem disposição para cogitações que transcendam aos interesses imediatistas. 

Detalhe significativo:

Várias mulheres acompanharam a via-crúcis de Jesus.
Os homens, com exceção de João, estavam longe.
Temiam represálias.

Tanto quanto Simãos, há várias Marias no Evangelho.
No monte Calvário, acompanhando Jesus, estavam três:

• Sua mãe.
• A jovem de Magdala. 
• A mãe de Tiago Menor.

Maria, que significa senhora, é o nome mais comum nos países cristãos, homenagem às homônimas que aparecem na vida de Jesus, particularmente sua genitora.

• Tem doce musicalidade;
• Está impregnado de suave magnetismo;
• Vibra doce e terno, como uma carícia em nossos ouvidos;
• Inspira composições poéticas;
• É repositório de consolação para os sofredores.

Significativamente, principia no eme que todos temos na palma da mão.

Observe, leitor amigo.

É a perene homenagem dos Céus a Maria de Nazaré, consagrada, meritoriamente, mãe espiritual da Humanidade.

Richard Simonetti
Livro Tua fé te salvou


AS MULHERES DO EVANGELHO - JOANA DE CUSA



Entre a multidão que invariavelmente acompanhava a Jesus nas pregações do lago, achava-se sempre uma mulher de rara dedicação e nobre caráter, das mais altamente colocadas na sociedade de Cafarnaum. Tratava-se de Joana, consorte de Cusa, intendente de Ântipas, na cidade onde se conjugavam interesses vitais de comerciantes e de pescadores. Joana possuía verdadeira fé; contudo, não conseguiu forrar-se às amarguras domésticas, porque seu companheiro de lutas não aceitava as claridades do Evangelho.
Considerando seus dissabores íntimos, a nobre dama procurou o Messias, numa ocasião em que ele descansava em casa de Simão, e lhe expôs a longa série de suas contrariedades e padecimentos. O esposo não tolerava a doutrina do Mestre. Alto funcionário de Herodes, em perene contacto com os representantes do Império, repartia as suas preferências religiosas, ora com os interesses da comunidade judaica, ora com os deuses romanos, o que lhe permitia viver em tranquilidade fácil e rendosa. Joana confessou ao Mestre os seus temores, suas lutas e desgostos no ambiente doméstico, expondo suas amarguras em face das divergências religiosas existentes entre ela e o companheiro.

Após ouvir-lhe a longa exposição, Jesus lhe ponderou:— Joana, só há um Deus, que é o Nosso Pai, e só existe uma fé para as nossas relações com o seu amor. Certas manifestações religiosas, no mundo, muitas vezez não passam de vícios populares nos hábitos exteriores. Todos os templos da Terra são de pedra; eu venho, em nome de Deus, abrir o templo da fé viva no coração dos homens. Entre o sincero discípulo do Evangelho e os erros milenários do mundo, começa a travar-se o combate sem sangue da redenção espiritual. Agradece ao Pai o haver-te julgado digna do bom trabalho, desde agora.

Teu esposo não te compreende a alma sensível? Compreender-te-à um dia. É leviano e indiferente? Ama-o, mesmo assim Não te acharias ligada a ele se não houvesse para isso razão justa. Servindo-o com amorosa dedicação, estarás cumprindo a vontade de Deus. Falas-me de teus receio: e de tuas dúvidas. Deves, pelo Evangelho, amá-lo ainda mais. Os sãos não precisam de médico. Além disso, não poderemos colher uvas nos abrolhos, mas podemos amanhar o solo que produziu cardos envenenados, a fim de cultivarmos nele mesmo a videira maravilhosa do amor e da vida.

Joana deixava entrever no brilho suave dos olhos a íntima satisfação que aqueles esclarecimentos lhe causavam; mas, patenteando todo o seu estado dalma, interrogou:— Mestre, vossa palavra me alivia o espírito atormentado; entretanto, sinto dificuldade extrema para um entendimento recíproco no ambiente do meu lar. Não julgais acertado que lute por impor os vossos princípios? Agindo assim, não estarei reformando o meu esposo para o céu e para o vosso reino? O Cristo sorriu serenamente e retrucou:

— Quem sentirá mais dificuldade em estender as mãos fraternas, será o que atingiu as margens seguras do conhecimento com o Pai, ou aquele que ainda se debate entre as ondas da ignorância ou da desolação, da inconstância ou da indolência do espírito? Quanto à imposição das idéias — continuou Jesus, acentuando a im-rortância de suas palavras —, por que motivo Deus não impõe a sua verdade e o seu amor aos tiranos da Terra? Por que não fulmina com um raio o conquistador desalmado que espalha a miséria e a destruição, com as forças sinistras da guerra?

A sabedoria celeste não extermina as paixões: transforma-as. Aquele que semeou o mundo de cadáveres desperta, às vezes, para Deus, apenas com uma lágrima. O Pai não impõe a reforma a seus filhos: esclarece-os no momento oportuno. Joana, o apostolado do Evangelho é o de colaboração com o céu, nos grandes princípios da redenção. Sê fiel a Deus, amando o teu companheiro do mundo, como se fora teu filho. Não percas tempo em discutir o que não seja razoável. Deus não trava contendas com as suas criaturas e trabalha em silêncio, por toda a Criação. Vai!...

Esforça-te também no silêncio e, quando convocada ao esclarecimento, fala o verbo doce ou enérgico da salvação, segundo as circunstâncias! Volta ao lar e ama o teu companheiro como material divino que o céu colocou em tuas mãos para que talhes uma obra de vida, sabedoria e amor!... Joana de Cusa experimentava um brando alívio no coração. Enviando a Jesus um olhar de carinhoso agradecimento, ainda lhe ouviu as últimas palavras:— Vai, filha!... Sê fiel!

Desde esse dia, memorável para a sua existência, a mulher de Cusa experimentou na alma a claridade constante de uma resignação sempre pronta ao bom trabalho e sempre ativa para a compreensão de Deus. Como se o ensinamento do Mestre estivesse agora gravado indelevelmente em sua alma, considerou que, antes de ser esposa na Terra, já era filha daquele Pai que, do Céu, lhe conhecia a generosidade e os sacrifícios. Seu espírito divisou em todos os labores uma luz sagrada e oculta. Procurou esquecer todas as características inferiores do companheiro, para observar somente o que possuía ele de bom, desenvolvendo, nas menores oportunidades, o embrião vacilante de suas virtudes eternas.

Mais tarde, o céu lhe enviou um filhinho, que veio duplicar os seus trabalhos; ela, porém, sem olvidar as recomendações de fidelidade que Jesus lhe havia feito, transformava suas dores num hino de triunfo silencioso em cada dia. Os anos passaram e o esforço perseverante lhe multiplicou os bens da fé, na marcha laboriosa do conhecimento e da vida. As perseguições políticas desabaram sobre a existência do seu companheiro. Joana, contudo, se mantinha firme. Torturado pelas idéias odiosas de vingança, pelas dívidas insolváveis, pelas vaidades feridas, pelas moléstias que lhe verminaram o corpo, o ex-intendente de Ântipas voltou ao plano espiritual, numa noite de sombras tempestuosas.

Sua esposa, todavia, suportou os dissabores mais amargos, fiel aos seus ideais divinos edificados na confiança sincera. Premida pelas necessidades mais duras, a nobre dama de Cafarnaum procurou trabalho para se manter com o filhinho que Deus lhe confiara. Algumas amigas lhe chamaram a atenção, tomadas de respeito humano. Joana, no entanto, buscou esclarecê-las, alegando que Jesus igualmente havia trabalhado, calejando as mãos nos serrotes de modesta carpintaria e que, submetendo-se ela a uma situação de subalternidade no mundo, se dedicara primeiramente ao Cristo, de quem se havia feito escrava devotada.

Cheia de alegria sincera, a viúva de Cusa esqueceu o conforto da nobreza material, dedicou-se aos filhos de outras mães, ocupou-se com os mais subalternos afazeres domésticos, para que seu filhinho tivesse pão. Mais tarde, quando a neve das experiências do mundo lhe alvejou os primeiros anéis da fronte, uma galera romana a conduzia em seu bojo, na qualidade de serva humilde. No ano 68, quando as perseguições ao Cristianismo iam intensas, vamos encontrar, num dos espetáculos sucessivos do circo, uma velha discípula do Senhor amarrada ao poste do martírio, ao lado de um homem novo, que era seu filho. Ante o vozerio do povo, foram ordenadas as primeiras flagelações.

— Abjura!... — exclama um executor das ordens imperiais, de olhar cruel e sombrio. A antiga discípula do Senhor contempla o céu, sem uma palavra de negação ou de queixa. Então o açoite vibra sobre o rapaz seminu, que exclama, entre lágrimas: — "Repudia a Jesus, minha mãe!... Não vês que nos perdemos?! Abjura!... por mim, que sou teu filho!..."Pela primeira vez, dos olhos da mártir corre a fonte abundante das lágrimas. As rogativas do filho são espadas de angústia que lhe retalham o coração.— Abjura!... Abjura!

Joana ouve aqueles gritos, recordando a existência inteira. O lar risonho e festivo, as horas de ventura, os desgostos domésticos, as emoções maternais, os fracassos do esposo, sua desesperação e sua morte, a viuvez, a desolação e as necessidades mais duras... Em seguida, ante os apelos desesperados do filhinho, recordou que Maria também fora mãe e, vendo o seu Jesus crucificado no madeiro da infâmia, soubera conformar-se com os desígnios divinos. Acima de todas as recordações, como alegria suprema de sua vida, pareceu-lhe ouvir ainda o Mestre, em casa de Pedro, a lhe dizer: —

"Vai filha! Sê fiel!" Então, possuída de força sobre-humana, a viúva de Cusa contemplou a primeira vítima ensanguentada e, fixando no jovem um olhar profundo e inexprimível, na sua dor e na sua ternura, exclamou firmemente:— Cala-te, meu filho! Jesus era puro e não desdenhou o sacrifício. Saibamos sofrer na hora dolorosa, porque, acima de todas as felicidades transitórias do mundo, é preciso ser fiel a Deus! A esse tempo, com os aplausos delirantes do povo, os verdugos lhe incendiavam, em derredor, achas de lenha embebidas em resina inflamável. Em poucos instantes, as labaredas lamberam-lhe o corpo envelhecido. Joana de Cusa contemplou com serenidade a massa de povo que lhe não entendia o sacrifício.

Os gemidos de dor lhe morriam abafados no peito opresso. Os algozes da mártir cercaram-lhe de impropérios a fogueira:— O teu Cristo soube apenas ensinar-te a morrer? — perguntou um dos verdugos. A velha discípula, concentrando a sua capacidade de resistência, teve ainda forças para murmurar:— Não apenas a morrer, mas também a vos amar!...Nesse instante, sentiu que a mão consoladora do Mestre lhe tocava suavemente os ombros, e lhe escutou a voz carinhosa e inesquecível:— Joana, tem bom ânimo!... Eu aqui estou!...

Humberto de Campos (Espírito)