terça-feira, 28 de abril de 2015

Caridade sob a ótica espírita

Caridade sob a ótica espírita


Após a saída do Egito, Moisés passou a conviver com o seu povo no deserto, onde as frequentes queixas e revoltas, aliadas aos rigores climáticos, fatores determinantes da fome e da sede, eram a realidade diária.

A esmagadora maioria dos hebreus, devido à crueldade da escravidão, encontrava-se revoltada, brutalizada e reduzida à egoística satisfação das necessidades primárias.

Pais vendiam os seus filhos, as mulheres eram tratadas como alimárias, os velhos eram abandonados.

Nessas circunstâncias, em que o lado animal do homem sobressai, só a dor e o instinto de conservação conseguem domá-lo.

Daí a severa legislação mosaica contida no Código da Aliança (Êxodo capítulos 21 a 24).

Leis estas, temporárias, elaboradas para determinado período histórico daquele povo, onde a disciplina deveria suplantar tudo mais.

Não prejudicareis à viúva e ao órfão. Se os prejudicardes, eles clamarão a mim e eu os ouvirei; minha cólera se inflamará e vos farei perecer pela espada; vossas mulheres ficarão viúvas e vossos filhos, órfãos. (Êxodo, 22: 22 a 24)

Perecer pela espada. A justiça feita pelo fio da espada não nos parece um dos atributos divinizadores do Pai. Sem dúvida nenhuma, muitas das leis foram escritas por Moisés. Apresentar um Deus “vingativo” foi a única forma de redirecionar o comportamento dos ex-escravos.

A disciplina precede a espontaneidade, já nos alertou Emmanuel. De fato, a princípio adotamos determinados comportamentos por disciplina: um “bom dia” à caixa do supermercado, ao gari, um “por favor” antes de nossas solicitações, um “obrigado” àqueles que nos ajudaram, etc. Com o tempo estas atitudes incorporam-se ao nosso dia a dia de forma espontânea. Natural.

Caridade de Jesus

O Espírito Emmanuel, no capítulo 16, de Roteiro, psicografado por Francisco Candido Xavier, diz:

O Mestre não se limita a ensinar o bem. Desce ao convívio da multidão e materializa-o com o próprio esforço. Cura os doentes na via pública, sem cerimônia, e ajuda a milhares de ouvintes, amparando-os na solução dos mais complicados problemas de natureza moral, sem valer-se das etiquetas de culto externo.

E conclui em Caminho, Verdade e Vida, capítulo 106:

Jesus é o nosso Mestre nas ocorrências mínimas. E se ouvimo-Lo recomendando estejamos prontos a dar “a qualquer” que pedir (Lucas, 6:30), vemo-Lo atendendo a todas as criaturas, mas segundo as necessidades.

De fato, Jesus proporcionou a cada situação e a cada personalidade o que necessitavam. Concedeu:

Bem aventuranças aos aflitos;
Advertências aos vendilhões;
Deu alegrias nas botas de Caná; e
Repreensões em assembléias dos discípulos.

Caridade depois de Jesus pode ser:

- Paliativa: consiste na utilização de recurso para atenuar um mal ou adiar uma crise.

- Educativa: é a utilização de um conjunto de normas pedagógicas tendentes ao desenvolvimento geral do corpo e do espírito.

A esmola

Mais uma vez ouçamos Emmanuel em Caminho, Verdade e Vida, ainda no capítulo 106:

O ato de dar é dos mais sublimes nas operações da vida; entretanto, muitos homens são displicentes e incompreensíveis na execução dele.

Alguns distribuem esmolas levianamente, outros se esquecem da vigilância, entregando seu trabalho a malfeitores. (Grifei)

Quando agimos de forma leviana, de maneira precipitada, não raro esquecemos imprudentemente a vigilância.

A riqueza, assim como não é dada a uns para ser aferrolhada num cofre forte, também não o é a outros para ser dispensada ao vento. – LE questão 896.

A prodigalização não traduz desprendimento dos bens materiais.

Paulo em sua epístola aos Romanos, no capitulo 14, versículo 15, assim se manifesta sobre o comportamento leviano:

Mas, se por causa da comida se contrista teu irmão, já não andas conforme o amor. Não destruas por causa da tua comida aquele por quem Cristo morreu.

A esmola ou até mesmo a ajuda, o socorro, não devem ser objeto de tristeza ou humilhação para o assistido. Este gesto de assistência social, antes de tudo, deve estar revestido de amor ao próximo. Assim, não pode ser fruto da precipitação, mas resultante de um labor bem planejado.

Na questão 888 de “O Livro dos Espíritos”, a Espiritualidade Superior assim se manifesta ao Codificador com relação àquele que pede esmolas:

Condenando-se a pedir esmola, o homem se degrada física e moralmente: embrutece-se. Uma sociedade que se baseie na lei de Deus e na justiça deve prover à vida do fraco, sem que haja para ele humilhação. Deve assegurar a existência dos que não podem trabalhar, sem deixar a vida a mercê do acaso e da boa vontade de alguns.

O forte deve trabalhar para o fraco. Não tendo este família, a sociedade deve fazer as vezes desta. É a lei de caridade. LE questão 685 ”a”.

Através do trabalho o homem tem infinitas lições necessárias à evolução. Aprende:

a trabalhar em equipe;
a ter responsabilidade, observando os horários estabelecidos, desenvolvendo satisfatoriamente as tarefas sob sua condução;
a ter respeito pelo chefe e pelos colegas;
a ter humildade recebendo e observando as orientações recebidas de seus superiores;
a ter criatividade e iniciativa;
a lidar com situações imprevistas;

Na questão 255 de “O Consolador” Emmanuel nos esclarece quanto à Caridade espiritual e material assim dizendo:

Todo serviço da caridade desinteressada é um reforço divino na obra da fraternidade humana e da redenção universal.

Entretanto nos adverte:

Urge, contudo, que os espiritistas sinceros, esclarecidos no Evangelho, procurem compreender a feição educativa dos postulados doutrinários, reconhecendo que o trabalho imediato dos tempos modernos é o da iluminação interior do homem, melhorando-se-lhe os valores do coração e da consciência. (Grifei)

E conclui.

As obras da caridade material somente alcançam a sua feição divina quando colimam a espiritualização do homem, renovando-lhe os valores íntimos, porque, reformada a criatura humana em Jesus Cristo, teremos na Terra uma sociedade transformada.

Allan Kardec em sua nota à questão 685 ”a” assim fala da educação:

Há um elemento que se não costuma fazer pesar na balança e sem o qual a ciência econômica não passa de simples teoria. Esse elemento é a educação, não a educação intelectual, mas a educação moral. Não nos referimos, porém, à educação moral pelos livros e sim à que consiste na arte de formar caracteres, à que incute hábitos, porquanto a educação é o conjunto dos hábitos adquiridos. (Grifei)

Na questão 256 de “O Consolador” Emmanuel ao falar sobre esmola material assim se expressa:

Ninguém, decerto, poderá reprovar o ato de pedir e, muito menos, deixará de louvar a iniciativa de quem dá a esmola material;

Mas nos adverte:

Todavia é oportuno considerar que à medida que o homem se cristianiza, iluminando as suas energias interiores, mais se afasta da condição de pedinte para alcançar a condição elevada do mérito, pelas expressões sadias do seu trabalho.

E esclarece:

No mecanismo de relações comuns, o pedido de uma providência material tem o seu sentido e a sua utilidade oportuna, como resultante da lei de equilíbrio que preside o movimento das trocas no organismo da vida.

E por fim conclui:

A esmola material, porém, é índice da ausência de espiritualização nas características sociais que a fomentam.

Allan Kardec - ESE cap. XV – item 8 nos adverte que:

A máxima – Fora da caridade não há salvação consagra o princípio da igualdade perante Deus e da liberdade de consciência.

De fato, a caridade – que é o amor em ação, personifica a lei de igualdade, uma vez que, através da assistência social, fazemo-nos iguais. Se temos o cobertor que nos aquece nos dias mais frios, o assistido também o terá.

Na recomendação: "Dai antes esmola do que tiverdes" - (Lucas, 11:41), Jesus nos mostra que a caridade é muito mais que distribuição de valores e bens materiais. Portanto, a caridade sem recurso materiais, notadamente sem dinheiro, consiste em:

Extinguir todos os pensamentos inferiores que lhe são sugeridos;
Ante a maledicência retrair-se recordando pequenas virtudes do ausente;
Ante à cólera fácil quietar-se considerando-a uma enfermidade a ser tratada;
Não reagir aos insultos alheios continuando a tratar o ofensor com a fraternidade habitual;
Desfazer as nuvens da incompreensão, reparando a tranquilidade de alguém;

A sublimidade da virtude, porém, está no sacrifício do interesse pessoal, pelo bem do próximo, sem pensamento oculto. A mais meritória é a que assenta na mais desinteressada caridade, - LE questão 893.

Por fim não podemos esquecer que para Jesus o verdadeiro sentido da palavra caridade, consistia em:

Benevolência para com todos, indulgência para as imperfeições dos outros, perdão das ofensas. – LE, questão 886.

Jesus seja sempre conosco.

Marcos José Ferreira da Cruz Machado
Belo Horizonte (MG)
Dezembro/2012

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