sábado, 23 de julho de 2011

JESUS EM NAZARÉ - Caibar

JESUS EM NAZARÉ

"Indo a Nazaré, onde se criara, ao sábado, entrou na sinagoga, segundo o seu costume, e levantou-se para ler. Foi-lhe entregue o livro do profeta Isaías e, abrindo-o, achou o lugar em que estava escrito: "O Espírito do Senhor está sobre mim, pelo que me ungiu para anunciar boas novas aos pobres e enviou-me para proclamar a liberdade aos cativos, restaurar a vista aos cegos, pôr em liberdade os oprimidos e proclamar o ano aceitável do Senhor. "

"Tendo fechado o livro, entregou-o ao assistente e sentou-se; e todos na sinagoga tinham os olhos fixos nele: Então começou Jesus a dizer-lhes: Hoje se cumpriu esta Escritura nos vossos ouvidos. E todos lhe davam testemunho e se maravilhavam das palavras cheias de graça que saíam da sua boca, e perguntavam: Não é este o filho de José? Disse-lhes Jesus: Sem dúvida citar-me-eis este provérbio: Médico, cura-te a ti mesmo; tudo o que soubemos que fizeste em Cafarnaum, faze-o também aqui na tua terra. E proseguiu: Em verdade vos afirmo que nenhum profeta é aceito na sua terra.
Porém com certeza vos digo que muitas viúvas havia em Israel nos dias de Elias, quando se fechou o Céu por três anos e seis meses, de modo que houve uma grande fome sobre a Terra; e a nenhuma delas foi Elias enviado, senão a uma viúva de Sarepta, de Sidon. Havia também muitos leprosos em Israel no templo do profeta Eliseu; e nenhum deles ficou limpo, senão Naamã, o sírio. E todos na sinagoga se encheram de ira ao ouvir estas coisas; levantando-se, expulsaram-no da cidade e olevaram até o cume da montanha sobre o qual estava edificada a cidade, para o precipitarem; mas Jesus, passando por meio deles, seguiu o seu caminho. " (Lucas iv, 10-30)

"Tendo Jesus saído dali, foi para a sua terra, e seus discípulos o acompanharam. Chegando o sábado, começou a ensinar na sinagoga; e muitos, ao ouvi-lo, se admiravam dizendo: Donde lhe vem estas coisas, e que sabedoria é esta que lhe é dada? E que significam tais milagres operados por sua mão? Não é este o carpinteiro, filho de Maria, irmão de Tiago, de José, de Judas e de Simão? E suas irmãs não estão aqui entre nós?"

"E ele lhes servia de pedra de tropeço. Então Jesus lhes disse: Um profeta não deixa de receber honra, senão em sua terra, entre os seus parentes e na sua casa. E não podia fazer ali nenhum milagre, a não ser que pôs as mãos sobre alguns enfermos e os curou. E admirou-se por causa da incredulidade do povo. Ele andava pelas aldeias circunvizinhas ensinando. " (Marcos vi, 1-6)

"E chegando à sua terra, ensinava o povo na sinagoga, de modo que muitos se admiravam e diziam: Donde lhe vem esta sabedoria, e estes milagres? Não é este o filho do carpinteiro? Sua mãe não se chama Maria, e seus irmãos não são Tiago, José, Simão e Judas? E não vivem entre nós todas as suas irmãs? Donde lhe vem, pois, tudo isso? E ele lhes servia de pedra de tropeço. Mas disse-lhes Jesus: Um profeta não deixa de receber honra, senão na sua terra e na sua casa. E não fez ali muitos milagres por causa da incredulidade do povo. " (Mateus XIII, 54-58)

Os profetas só têm honra em sua terra, depois de mortos. Nessa ocasião todos lhes dão a primazia, todos exploram o direito patriótico de os exaltarem. Enquanto vivos, contudo, deles todos zombam, são menosprezados, repudiados. Assim acontece nas demais ramificações do saber humano: em sua terra um artista não tem arte, um sábio não tem 
sabedoria, um santo não tem virtudes, embora suas obras se contraponham às negações.

Poderia, porventura, Jesus, criado em Nazaré, oriundo de família humilde, pobre artista que vivia do seu trabalho rústico, gozar, na sua terra, das regalias de um profeta de Deus? Não, não podia. Os preconceitos humanos estão acima de todos os raciocínios, de toda a lógica, impedindo o funcionamento da razão. O Mestre e Senhor já sabia de tudo isto, mas fazia-se mister que o Evangelho fosse pregado em Nazaré; por isso, logo que chegou, aguardou o sábado, em que as sinagogas funcionavam, e tomou a tribuna, porque era esse um direito que a ninguém podia ser recusado.

Naquele tempo os livros que formam hoje o Antigo Testamento não se achavam enfeixados num só volume. Foi-lhe entregue o do profeta Isaías. O Mestre escolheu o trecho que fazia referência à sua missão, toda celeste, toda divina; leu-o, fechou o livro, passou-o ao assistente e sentou-se. Até aquela data o Senhor já havia dado demonstração positiva da alta incumbência que lhe fora confiada: muitas excelentes novas já animavam corações, inúmeros cativos se achavam libertos, cegos haviam recuperado a vista, e o ano aceitável do Senhor já se irradiava em luz benéfica por toda a Palestina.
O Mestre poderia, sem receio, apregoar que nele, de fato, se cumpria aquela Escritura, cujo anúncio era ansiosamente esperado por todas as nações. Mas o homem terreno não se prende ao fundo, à essência, ao Espírito de quem fala; olha para a forma e fascina-se pela palavra que soa. A forma não era má, a palavra era atraente, mas a condição humilde de quem falava era um embaraço para a recepção da Doutrina, que, para ser mesmo pura e verdadeira, deveria ser dada por alguma eminência de alta estirpe e trazer o selo oficial!
Todos aplaudiam o Mestre, arrebatados pela sua Palavra sem mácula, cheia de graça e de amor; ficavam maravilhados, mas o espírito do preconceito perguntava pelos seus lábios: "não é este o carpinteiro, filho de Maria, irmão de Tiago, de José, de Judas e de Simão? Suas irmãs não estão entre nós? Não é este o filho do carpinteiro José?"

Como poderia Jesus livrar-se desse maldito espírito que em vez de sondar corações, devassa a vida privada, semeando mazelas onde não as encontra e distribuindo defeitos onde só há virtudes? Por maior que fosse a força moral do Mestre, por maior que fosse a autoridade de que se revestisse, Ele não se livraria daquele "defeito" - ser um carpinteiro, filho de humilde carpinteiro José, e ter por mãe, irmãos e irmãs, gente do povo que não se salientava por nenhuma representação oficial.

Como poderia o "médico que curava os outros", curar a si mesmo, do mal que os outros diziam prejudicá-lo? Poderia ele fazer em Nazaré tudo o que fizera em Cafarnaum? Não, não podia, porque nenhum profeta é aceito na sua terra, e, além disso, os profetas não podem ser mesmo recebidos por todos, nem a todos são enviados. Em Israel havia muitas viúvas no tempo de Elias, entretanto, a nenhuma delas Elias foi enviado senão à de Sarepta, de Sidon. Muitos leprosos haviam em Israel no tempo de Eliseu, mas nenhum deles ficou limpo, senão Naamã, chefe do exército do rei da Síria.

Os profetas não são enviados a quem não está em condições de recebê-los, assim como não se dá pérolas a suínos, nem brilhantes a felinos, nem as coisas santas aos cães, para que não as despedacem. E como se poderia enviar um médico a doentes que não se querem tratar?!
Mas os mesmos que se arrebatavam, primeiramente com suas palavras cheias de graças, aqueles mesmos que se mostravam maravilhados ouvindo-o, quando ouviram essa censura acre, mas cheia de razão, encheram-se de ira, expulsaram-no da cidade, tentaram precipitá-lo do monte sobre o qual estava a cidade, mas o Mestre não se deixou prender e partiu para outro lugar, pois lhe convinha anunciar o Evangelho em outras povoações.
Entretanto, mesmo na terra da descrença, em Nazaré, Jesus conseguiu curar alguns enfermos, diz o Evangelista Marcos; e, se mais não pôde fazer, diz Mateus, foi devido à incredulidade do povo. A visita a Nazaré, feita por Jesus, testemunha ou faz lembrar mais um dos inúmeros sentimentos de benevolência e abnegação que eram os característicos de tão extraordinária individualidade.
Ele sabia de antemão os resultados que produziria a sua ida a Nazaré, mas era preciso que ficasse gravada nas páginas de sua História mais esse ato de altruísmo do seu elevadíssimo caráter.
Cairbar Schutel

Ninguém é Profeta em sua Terra - Gênese


1. E, tendo vindo à sua terra natal, ele os instruía nas sinagogas, de sorte que, tomados de espanto, diziam: De onde lhe vieram essa sabedoria e esses milagres? _ Não é este o filho do carpinteiro? Sua mãe não é Maria, e seus irmãos Tiago, José, Simão e Judas? E suas irmãs, não se acham todas entre nós? E assim faziam dele objeto de escândalo. Mas Jesus lhes disse: Um profeta só não é honrado em sua terra e em sua casa. _ E não fez lá muitos milagres devido à sua incredulidade. (S. Mateus, Cap. XIII, vers. de 54 a 58).
2. Jesus enunciou ali uma verdade transformada em provérbio, que é de todos os tempos, e à qual se poderia dar mais extensão dizendo que ninguém é profeta enquanto viver.
Na linguagem usual, esta máxima se aplica ao crédito que alguém goza entre aqueles em cujo meio vive, da confiança que lhes inspira pela superioridade do saber e da inteligência. Se sofre exceções, são raras, e em todo o caso, elas não são jamais absolutas; o princípio desta ver dade é uma conseqüência natural da fraqueza humana, e pode explicar-se assim.
O hábito de se verem desde a infância, nas circunstâncias vulgares da vida, estabelece entre os homens uma espécie de igualdade material que faz com que, muitas vezes, as pessoas recusem reconhecer uma superioridade moral naquele que foi o companheiro ou o comensal, que saiu do mesmo meio e de quem se viram as primeiras fraquezas; o orgulho sofre pelo ascendente que é obrigado a suportar. Quem quer que se eleve acima do nível comum está sempre em luta com o ciúme e com a inveja; aqueles que se sentem incapazes de atingir sua altura esforçam-se por rebaixá-lo por meio da difamação, da maledicência e da calúnia; gritam tanto mais forte quanto se vêm menores, acreditando se engrandecer e eclipsá-lo pelo ruído que fazem. Tal tem sido e tal será a história da humanidade, enquanto os homens não compreenderem sua natureza espiritual e não houverem alargado seu horizonte moral; também este preconceito é próprio dos espíritos estreitos e vulgares, que tudo medem por sua própria personalidade.
Por outro lado, toda gente em geral, faz dos homens apenas conhecidos por seu espírito um ideal que cresce com o afastamento dos tempos e dos lugares. Eles são como que despojados da humanidade; parece que não devem falar nem sentir como o mundo; que sua linguagem e seus pensamentos devem estar constantemente no diapasão da sublimidade, sem cuidar que o Espírito não poderia estar constantemente em estado de tensão, e num perpétuo estado de super-excitação. No contato diário da vida privada, se vê demasiado o homem material, que nada distingue do vulgar. O homem corporal, que impressiona os sentidos, apaga quase o homem espiritual, que apenas impressiona o Espírito; de longe, apenas se percebem os brilhos do gênio; de perto, vê-se o repouso do Espírito.
Depois da morte, a comparação não existe mais, o homem espiritual permanece só, e parece ser tanto maior, quanto se afasta a recordação do homem corporal. Eis porque os homens que marcaram sua passagem por obras de valor real, são mais apreciados depois de sua morte que enquanto vivem. São julgados com mais imparcialidade, porque os invejosos e os ciumentos desapareceram, e os antagonismos pessoais não existem mais. A posteridade é um juiz desinteressado que aprecia a obra do Espírito, aceita-a sem entusiasmo cego se ela for boa, rejeita-a sem ódio se ela for má, feita abstração da individualidade que a produziu.
Jesus pouco podia escapar às conseqüências desse princípio, inerente à natureza humana, por viver num ambiente pouco esclarecido e entre homens devotados inteiramente à vida material. Seus compatriotas viam nele apenas o filho do carpinteiro, o irmão de homens tão ignorantes quanto eles, e se perguntavam que é que podia torná-lo superior a si próprios e dar-lhe o direito de censurá-los; também, vendo que sua palavra tinha menos crédito sobre os seus, que o desprezavam, foi pregar entre aqueles que o escutavam, no meio onde encontrava simpatia.
Pode-se julgar de que sentimentos seus conhecidos estavam animados em relação a ele, pelo fato de que seus próprios irmãos, acompanhados de sua mãe, vieram a uma assembléia onde ele se encontrava, para se apoderarem dele, dizendo que ele havia perdido o espírito. (S. Marcos, Cap. III, vers. 20, 21, e de 31 a 35). O Evangelho segundo o Espiritismo, cap. XIV).
Assim, por outro lado, os sacerdotes e os fariseus acusavam Jesus de agir pelo demônio; do outro, era taxado de loucura pelos seus próprios parentes. Não é assim que hoje se costuma fazer com relação aos espíritas, e estes devem se queixar de não serem melhor tratados por seus concidadãos do que o foi Jesus? Aquilo que nada tinha de espantoso há dois mil anos, num povo ignorante, é mais estranho no século XIX, nas nações civilizadas.

Ninguém é prefeta em sua terra - cvdee

1.- Tendo vindo à sua terra natal, instruía-os nas sinagogas, de sorte que, tomados de espanto, diziam: 
Donde lhe vieram essa sabedoria e esses milagres? - Não é o filho daquele carpinteiro? Não se chama 
Maria, sua mãe, e seus irmãos Tiago, José, Simão e Judas? Suas irmãs não se acham todas entre nós? 
Donde então lhe vêm todas essas coisas? - E assim faziam dele objeto de escândalo. Mas, Jesus lhes 
disse: Um profeta só não é honrado em sua terra e na sua casa. - E não fez lá muitos milagres devido à 
incredulidade deles. (S. Mateus, cap. XIII, vv. 54-58.)

2.- Enunciou Jesus dessa forma uma verdade que se tornou provérbio, que é de todos os tempos e à qual se poderia dar maior amplitude, dizendo que ninguém é profeta em vida.

Na linguagem usual, essa máxima se aplica ao crédito de que alguém goza entre os seus e entre aqueles em cujo seio vive, à confiança que lhes inspira pela superioridade do saber e da inteligência. Se ela sofre exceções, são raras estas e, em nenhum caso, absolutas. O princípio de tal verdade reside numa consequência natural da fraqueza humana e pode explicar-se deste modo:

O hábito de se verem desde a infância, em todas as circunstâncias ordinárias da vida, estabelece entre os homens uma espécie de igualdade material que, muitas vezes, faz que a maioria deles se negue a reconhecer superioridade moral num de quem foram companheiros ou comensais, que saiu do mesmo meio que eles e cujas primeiras fraquezas todos testemunharam. Sofre-lhes o orgulho com o terem de reconhecer o ascendente do outro. Quem quer que se eleve acima do nível comum está sempre em luta com o ciúme e a inveja. Os que se sentem incapazes de chegar à altura em que aquele se encontra esforçam-se para rebaixá-lo, por meio da difamação, da maledicência e da calúnia; tanto mais forte gritam, quanto menores se acham, crendo que se engrandecem e o eclipsam pelo arruído que promovem. Tal foi e será a História da Humanidade, enquanto os homens não houverem compreendido a sua natureza espiritual e alargado seu horizonte moral. Por aí se vê que semelhante preconceito é próprio dos espíritos acanhados e vulgares, que tomam suas personalidades por ponto de aferição de tudo. 

Doutro lado, toda gente, em geral, faz dos homens apenas conhecidos pelo espírito um ideal que cresce à medida que os tempos e os lugares se vão distanciando. Eles são como que despojados de todo cunho de humanidade; parece que não devem ter falado, nem sentido como os demais; que a linguagem de que usaram e seus pensamentos hão de ter ressoado
constantemente no diapasão da sublimidade, sem se lembrarem, os que tal imaginam, que o espírito não poderia permanecer constantemente em estado de tensão e de perpétua superexcitação. No contacto da vida privada, vê-se por demais que o homem material em nada se distingue do vulgo. O homem corpóreo, que os sentidos humanos percebem, quase que apaga o homem espiritual, do qual somente o espírito se percebe. De longe, apenas se vêem os relâmpagos do gênio; de perto, vêem-se as paradas do espírito. 

Depois da morte, nenhuma comparação mais sendo possível, unicamente o homem espiritual subsiste e tanto maior parece, quanto mais longínqua se torna a lembrança do homem corporal. É por isso que aqueles cuja passagem pela Terra se assinalou por obras de real valor são mais apreciados depois de mortos do que quando vivos. São julgados com mais imparcialidade, porque, já tendo desaparecido os invejosos e os ciosos, cessaram os antagonismos pessoais. A posteridade é juiz desinteressado no apreciar a obra do espírito; aceita-a sem entusiasmo cego, se é boa, e a rejeita sem rancor, se é má, abstraindo da individualidade que a produziu. 

Tanto menos podia Jesus escapar às conseqüências deste princípio, inerente à natureza humana, quanto pouco esclarecido era o meio em que ele vivia, meio esse constituído de criaturas votadas inteiramente à vida material. Nele, seus compatriotas apenas viam o filho do carpinteiro, o irmão de homens tão ignorantes quanto ele e, assim sendo, não percebiam o que lhe dava superioridade e o investia do direito de os censurar. Verificando então que a sua palavra tinha menos autoridade sobre os seus, que o desprezavam, do que sobre os estranhos, preferiu ir pregar para os que o escutavam e aos quais inspirava simpatia. 

Pode-se fazer idéia dos sentimentos que para com ele nutriam os que lhe eram aparentados, pelo fato de que seus próprios irmãos, acompanhados de sua mãe, foram a uma reunião onde ele se encontrava, para dele se apoderarem, dizendo que perdera o juízo. (S. Marcos, cap. III, vv. 20, 21 e 31 a 35. - O Evangelho segundo o Espiritismo, cap. XIV.) 

Assim, de um lado, os sacerdotes e os fariseus o acusavam de obrar pelo demônio; de outro, era tachado de louco pelos seus parentes mais próximos. Não é o que se dá em nossos dias com relação aos espíritas? E deverão estes queixar-se de que os seus concidadãos não os tratem melhor do que os de Jesus o tratavam? O que há de estranhável é que, no século dezenove e no seio de nações civilizadas, se dê o que, há dois mil anos, nada tinha de espantoso, por parte de um povo ignorante.


QUESTÕES PARA ESTUDO

a) Segundo Kardec, como podemos entender a seguinte frase de Jesus: "Um profeta só não é honrado em sua terra e na sua casa"?

b) Por a aceitação dos ensinamentos de um espírito é maior à medida que nos afastamos da época de sua passagem pela Terra?

c) Por que Jesus preferia pregar e fazer milagres fora de sua terra natal?

terça-feira, 5 de julho de 2011

A Outra Margem - Espiritismo e Evangelho

E Disse-lhes naquele dia, ao cair da tarde: passemos para a outra margem. Deixando a multidão, eles o levaram, do modo como estava, no barco; e com ele havia outros barcos. (Marcos, 4: 35 e 36)

E Disse-lhes naquele dia, ao cair da tarde: passemos para a outra margem.

A julgar pela cronologia de Marcos, a passagem da “Tempestade Acalmada”, da qual retiramos estes versículos em epígrafe, se deu após um ensino público de Jesus em que o Mestre narrava algumas parábolas.
Em Mateus temos a mesma passagem após uma série, também pública, de curas.
Seja lá como for, o certo é que Jesus estava atuando em meio ao povo e convidou seus discípulos mais íntimos a afastar um pouco da multidão e passar para a outra margem.
Marcos, mais detalhista, ainda nos informa que tal acontecimento se deu ao cair da tarde.
Tudo no Evangelho tem a sua razão de ser, Jesus após um trabalho público, onde a sua abordagem tinha de estar ao alcance de todos, viu que era hora de dar um ensinamento mais profundo àqueles que estavam mais amadurecidos para as questões do espírito, que naquele momento eram seus discípulos mais próximos. Isto porque estes, em matéria evolucional, já estavam ao cair da tarde.
É importante que aqui façamos uma análise mais cuidadosa das expressões.
Tudo na vida se dá em etapas ou ciclos, que se fecham e se abrem em períodos maiores formando um todo cada vez mais completo. É uma manifestação da Lei das Unidades Coletivas.
Assim podemos dividir o dia em quatro ciclos que são: madrugada, manhã, tarde e noite; períodos que se ampliam nas semanas, nos meses, anos, e assim por diante.
Se na madrugada temos o início do processo caracterizado pelas trevas da ignorância, porém, uma ignorância devido à simplicidade e ao desconhecimento, na manhã temos a chegada da claridade e a possibilidade de iniciarmos o trabalho edificante; todavia este é um trabalho ainda em fase infantil que chegará ao amadurecimento justamente na tarde, que é o momento que nos interessa para o estudo que ora realizamos.
Assim, após o trabalho inicial com a multidão, que representa os que ainda estavam na manhã da infância espiritual, Jesus convida aqueles que já estavam mais maduros para um ensinamento de maior complexidade. E isto só poderia acontecer ao cair da tarde.
Deste modo, faz o Mestre mais um convite significativo: passemos para a outra margem.
Que outra margem seria esta?
Geograficamente poderia ser a margem oriental do lago de Tiberíades, todavia espiritualmente sua localização nos leva a meditações mais profundas…
A grande missão de Jesus era educar o nosso espírito, e assim nos conduzir a um porto mais seguro; desta forma, nos convoca a avançar e passar para uma margem diferente da que nos situamos atualmente. Uma margem onde cultivaremos os valores eternos, imutáveis, menos sujeitos às instabilidades ocasionadas pelos interesses imediatistas.
Esta margem é o campo operacional daquele que deseja realizar-se como uma criatura a integrar-se no serviço do Senhor Supremo em favor de todos.
Sempre que terminamos uma etapa de nossa vida, passamos para uma outra margem.
Para aquele que terminou o ensino médio a universidade é a outra margem, que no futuro poderá ser a pós-graduação, o mestrado, etc.. Na repartição de trabalho uma chefia pode ser esta margem significando promoção e mais responsabilidade.
Porém, a outra margem  caracterizada pelo nosso amadurecimento com o Cristo é sem dúvida o momento mais sublime de nossa realização espiritual, e nós que já meditamos sobre estas considerações anotadas neste que é o Livro da Libertação não podemos fugir às nossas responsabilidades; já nos situamos na boa margem da nossa redenção, basta para isso conscientizarmo-nos e realizarmos sob o aval de nossa consciência.
Muitos podem pensar que estamos divagando em cima dos textos evangélicos, todavia podemos com segurança afirmar que não estamos. É preciso compreender que Jesus é um Espírito Perfeito, e suas possibilidades estão “séculos-luz” à nossa frente. Por termos uma psicologia ainda materialista, não conseguimos alcançar o que Ele pode realizar. Ele há bilhões de anos, quando o nosso Orbe estava no início de sua gênese, já era o Cristo Planetário, supervisionando, assim, todos os processos de formação tanto da matéria quanto dos seres que viriam no momento oportuno aqui habitar. Deste modo, não podemos reduzir suas possibilidades. Ele é um educador com uma pedagogia avançadíssima; escolhia lugares e momentos didaticamente perfeitos para os ensinamentos  que queria levar aos seus educandos. Portanto, tudo e todas as sua ações devem ser consideradas quando tratamos de nossa auto-educação.
Levemos então, Ele, em nosso barco, e todas as tempestades que por necessidade ainda ocorrerem no mar de nossa vida, serão acalmadas na medida de nossa capacidade de colocá-Lo na direção.
Todavia é preciso termos fé e perseverar, pois a outra margem que já intuímos ainda não pode ser plenamente visualizada, e a fé é justamente o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que não se vêem.[1]
Deixando a multidão…

Ao comentar o versículo anterior chamamos a atenção para o significado do convite do Mestre quanto ao “passar para a outra margem”. Dando continuidades às anotações, o autor de Marcos, foi intuído pelos evangelistas da espiritualidade a informar-nos como deveria se dar esta passagem: deixando a multidão.
O que podemos entender por deixar a multidão? Será mesmo necessário este afastamento em vistas de ser o Evangelho a maior mensagem de inclusão de que já tivemos notícia?
Reflitamos sobre o significado do termo multidão sob dois aspectos: o exterior, e o íntimo.
Do ponto de vista exterior, podemos entender como multidão todos os elementos vinculados à proposta do mundo. São os que sem ter noção ou intuição de que existe algo para além da matéria, cuidam somente dos interesses ligados a esta. Aqui podemos incluir até mesmo muitos dos que se dizem espiritualistas, pois não são poucos os que se enquadram nesta condição, mas que vivem em função de mamom[2].
Deixar a multidão quer dizer fazer novas opções de encaminhamento de nosso livre arbítrio, é deixar hábitos passados que dizem respeito simplesmente aos interesses imediatistas. Quantas vezes em nosso dia a dia somos convidados a nos manifestar, seja no ambiente de família, seja no campo profissional, ou mesmo entre desconhecidos, e simplesmente repetimos atos passados mostrando que ainda estamos presos à retaguarda?
Devemos lembrar que segundo a orientação do Mestre, o cristão deve ser o “sal da terra”, a “luz do mundo”, devendo deste modo se diferenciar da maioria, ser incomum no meio em que convive.
Não estamos com isto querendo dizer que devemos ser elitistas, não é isso. Devemos conviver com todos, servir sem fazer acepção de pessoas, sermos inclusivos; todavia não podemos seguir a orientação da massa e nos fazer simplesmente mais um no meio da multidão.
Muitas vezes este distanciamento se dá até mesmo em relação aos nossos familiares, pois nem tudo os que estes desejam, nem todos os caminhos tomados por estes, podem ser adotados por nós como direção de conduta; vivemos em um mundo onde impera a dualidade, onde as forças do Sistema e do Anti-Sistema convivem lado a lado, cabendo deste modo, discernirmos e adotarmos a conduta que mais nos diz respeito quanto ao que desejamos em matéria de conquista.
Não devemos nos iludir, nem nos queixarmos, mas o sentimento de solidão é muito comum entre cristãos e não pode ser de outro modo. Quando falamos de solidão não estamos dizendo da falta de pessoas no convívio, pois disto até que não podemos nos queixar, visto que, se muito trabalhamos, muitas pessoas existem ao nosso redor, seja na condição de atendidos seja na de colaboradores; porém, falamos de uma solidão profunda, a que sentimos na intimidade por não sermos compreendidos em nossos anseios e em nossa busca.
Aquele que verdadeiramente adota a mensagem do Cordeiro naturalmente se deixa imolar em favor do outro, e esta postura, em desacordo com o sentimento da maioria, só pode nos levar a sermos incompreendidos e até sermos chamados de loucos. Porém não esqueçamos da orientação do apóstolo Paulo de que aquilo que é loucura para os homens é poder de Deus, enquanto que o que é sabedoria neste mundo é loucura para Deus.[3]
Não foi outro o motivo que levou Jesus a exemplificar quanto à necessidade de estarmos sós; é o que depreendemos do abandono sofrido por Ele no momento final de sua missão entre nós, justamente no ponto culminante da crucificação.
Mas nem tudo são dores, a Misericórdia do Pai é sempre maior, após a crucificação vem a ressurreição, e esta sim, é que é definitiva; para sempre com o Criador no Reino original.
Entendido a necessidade de avançarmos, de deixar a multidão  no plano exterior de nossas adesões, é preciso termos cautela e tolerância conosco mesmo, pois o processo de autoconhecimento que deve ser o norteador deste avanço, nos conduz com toda certeza à identificação da multidão mais difícil, a que existe dentro de nós mesmos, aquela que segundo o apóstolo Tiago nos leva a ser tentado, quando atraído e engodado pela própria concupiscência.[4]
 Não podemos esquecer que não nascemos ontem, ou seja, somos espíritos milenares que há muito tempo optamos por evoluirmos numa linha de ascensões e quedas, construindo, assim, um “Zé ninguém” herdeiro de um passado terrível. Portanto, se hoje queremos ter uma atitude diferente mais condizente com nossas necessidades espirituais, ainda somos influenciados por nossas próprias atitudes passadas que estão mais próximas do erro e das paixões.
Este conflito íntimo foi magistralmente percebido por Paulo de Tarso quando em sua carta aos Romanos nos alerta:
Porque bem sabemos que a lei é espiritual; mas eu sou carnal, vendido sob o pecado.
Porque o que faço, não o aprovo, pois o que quero, isso não faço; mas o que aborreço, isso faço.
E, se faço o que não quero, consinto com a lei, que é boa.
De maneira que, agora, já não sou eu que faço isto, mas o pecado que habita em mim.
Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum; e, com efeito, o querer está em mim, mas não consigo realizar o bem.
Porque não faço o bem que quero, mas o mal que não quero, esse faço.
Ora, se eu faço o que não quero, já o não faço eu, mas o pecado que habita em mim.
Acho, então, esta lei em mim: que, quando quero fazer o bem, o mal está comigo.
Porque, segundo o homem interior, tenho prazer na lei de Deus.
Mas vejo nos meus membros outra lei que batalha contra a lei do meu entendimento e me prende debaixo da lei do pecado que está nos meus membros.
Miserável homem que eu sou! Quem me livrará do corpo desta morte?[5]
 Todavia não desanimemos, a multidão que nos impede de deixar a multidão é transitória por não ser criação divina nem ser herança natural; quando a vida nos propõe um esforço no sentido do progresso, é sempre uma oportunidade de criarmos uma nova história, hábitos novos que vão sendo pouco a pouco incorporados em nosso modus vivendi e que vão substituindo nosso estado anterior.
Quando em nossa angustia pedimos aos Céus um guia e modelo, os habitantes das esferas superiores nos disseram ser Jesus o maior entre todos os outros. Temos em nossas mãos Sua Boa Nova repleta de consolo, de alegria, e de exemplos. Por que então não seguirmos aqueles que à nossa frente perceberam a maravilhosa oportunidade de redenção e de reencontro contida em sua mensagem?
Ouçamos, deste modo, o Mestre a falar na acústica de nossa alma:
Eu sou Jesus… não recalcitre contra os aguilhões.

[1] Cf. Paulo aos Hebreus, 11: 1)
[2] Palavra aramaica que significa "riquezas", as quais podem tornar-se um deus para as pessoas (cf. Mt 6,.24).
[3] Ver 1 Coríntios, cap.1: 18 e 19.
[4] Cf. Tiago, 1: 14
[5] Romanos, 7: 14 a 24