sábado, 9 de agosto de 2014

Causas das aflições

ARTHUR BERNARDES DE OLIVEIRA
tucabernardes@gmail.com
Guarani, Minas Gerais (Brasil)

Causas das aflições


Um dos problemas que mais afligem a mente humana é entender por que o sofrimento está de tal forma associado à vida das pessoas.

Não há, praticamente, nenhuma pessoa no mundo que não defronte, em algum momento de sua vida, com problemas de perturbação e de dor.

São as vicissitudes da encarnação a que se referem os Espíritos.

Podemos catalogar algumas dessas vicissitudes:

Doenças sérias, crônicas ou não: quem vive o problema conhece-lhe a extensão; quem não o conhece pode imaginar o sofrimento que envolve uma dessas doenças em pessoas da família;

Dificuldades no lar por motivos diversos: casamentos provacionais; separações; traição; falsidade; infidelidade; decepções com o companheiro ou com a companheira; ingratidão dos filhos; desrespeito de qualquer natureza; agressões físicas ou morais; alcoolismo; frigidez nas relações; egoísmo, comodismo, intolerância, mau-humor; filhos-problemas – (drogas, rebeldia, tendências viciosas, desvios sexuais, dificuldades de adaptação, autismos, deficiências de toda ordem, ojeriza ao trabalho, ociosidade, mau humor);

Dificuldades financeiras por falência; desemprego, remuneração insuficiente; maus negócios; jogos de azar;

Convivência difícil com vizinhos complicados; colegas de serviço individualistas e desrespeitosos; patrões insensíveis; rejeições; assédio sexual;

Calúnia, difamação, fofocas comprometedoras; suspeições;

Injustiças sociais: não reconhecimento no emprego; na sociedade; nos agrupamentos a que se dedica, nos clubes que freqüenta; na Igreja de sua fé;

Escolha errada de profissão;

Trabalho profissional desagradável;

Deficiências incapacitantes;

Dependência de terceiros.

Enfim, uma lista enorme da qual, alguns itens, de certo, tocam-nos de perto. E a gente quer saber. E se pergunta: – Por quê? Qual a razão? Vontade de Deus? Capricho da Providência?

Recomendam-nos paciência, sempre, os pais, os amigos, os religiosos. Que Deus sabe o que faz! Que Ele tem uma programação para nós. Que Deus é justo; é perfeito!

A gente vai suportando até onde dá, mas um dia reclama: – Será justo isso? Que fiz eu, meu Deus, para sofrer assim?

Eis a questão: Que fiz eu para sofrer assim? – Exatamente, aí está o problema.

No fundo do coração, lá dentro da alma, bem nos porões da nossa consciência, persegue-nos essa questão: Que fiz eu para sofrer assim? A gente sabe que alguma coisa fez para que o corretivo da dor nos alcance de qualquer forma.

Parece claro que o sofrimento, as doenças, as dificuldades não existem por vontade ou capricho de Deus. É até um desrespeito à inteligência e à misericórdia de Deus pensar dessa maneira. Deus não quer o sofrimento de ninguém; nem que algum de seus filhos se perca no caminho.

Deus é amor e só amor tem para nos dar. Mas, para o perfeito funcionamento do Universo e das coisas que o compõem, criou leis. Leis sábias, justas, perfeitas. Uma dessas leis, base das outras, é a lei de causa e efeito. A todo efeito corresponde uma causa, ou seja, não há efeito sem causa. O sofrimento é um efeito. Qual será a causa?

Os Espíritos nos informam que as causas de nossas aflições promanam de duas fontes bem diferentes, que importa distinguir. Umas são fruto da vida presente; outras vêm de existências anteriores.

De fato, remontando-se à origem dos males terrestres, reconheceremos que muitos são conseqüência natural do caráter e do proceder dos que os suportam.

Kardec, examinando a questão, no capítulo quinto, de O Evangelho segundo o Espiritismo, assim se expressou com toda a força de sua lógica:

“Quantos homens caem por sua própria culpa! Quantos são vítimas de sua imprevidência, de seu orgulho e de sua ambição!

“Quantos se arruínam por falta de ordem, de perseverança, pelo mau proceder, ou por não terem sabido limitar seus desejos!

“Quantas uniões infelizes por resultarem de um cálculo de interesse, ou de vaidade, e nas quais o coração não tomou parte alguma!

“Quantas dissensões e funestas disputas se teriam evitado com um pouco de moderação e menos suscetibilidade.

“Quantas doenças e enfermidades decorrem da intemperança e dos excessos de todo gênero! Álcool, fumo e drogas são os responsáveis pelo maior número de internações em nossos hospitais.

“Quantos pais são infelizes com seus filhos, porque não lhes combateram, desde o princípio, as más tendências! Por fraqueza, ou indiferença, deixaram que neles se desenvolvessem os germens do orgulho, do egoísmo e da tola vaidade, que produzem a secura do coração; depois, mais tarde, quando colhem o que semearam, admiram-se e se afligem da falta de consideração com que são tratados e da ingratidão deles.

“Interroguem friamente suas consciências todos os que são feridos no coração pelas vicissitudes e decepções da vida; remontem, passo a passo, à origem dos males que os torturam e verifiquem se, às mais das vezes, não poderão dizer: se eu houvesse feito ou deixado de fazer tal coisa, não estaria em semelhante condição.

“A quem, então, há de o homem responsabilizar por todas essas aflições, senão a si mesmo?

“O homem, pois, em grande número de casos, é o causador de seus próprios infortúnios.

“Os males dessa natureza fornecem, indubitavelmente, um notável contingente ao cômputo das vicissitudes da vida. O homem as evitará quando trabalhar por melhorar moralmente, tanto quanto intelectualmente.

“A lei humana atinge certas faltas e as pune. Pode, então, o condenado reconhecer que sofre a conseqüência do que fez. Mas a lei não atinge, nem pode atingir todas as faltas; incide especialmente sobre as que trazem prejuízo à sociedade e não sobre as que só prejudicam os que as cometem. Deus, porém, quer que todas as suas criaturas progridam e, portanto, não deixa impune qualquer desvio do caminho reto. Não há falta alguma, por mais leve que seja, nenhuma infração da sua lei que não acarrete forçosas e inevitáveis conseqüências, mais ou menos deploráveis. Daí se segue que, nas pequenas coisas, como nas grandes, o homem é sempre alcançado naquilo que errou, porque o erro humano – qualquer que seja – altera o equilíbrio da vida e descumpre a lei do amor, essência do código divino. Os sofrimentos que decorrem de seu erro são-lhe uma advertência de que procedeu mal. Dão-lhe experiência, fazem-lhe sentir a diferença entre o bem e o mal e a necessidade de se melhorar para, de futuro, evitar o que lhe originou uma fonte de amarguras; sem o que, motivo não haveria para que se corrigisse.

“Mas, se há males nesta vida cuja causa primária é o homem; outros há também aos quais, pelo menos na aparência, ele é completamente estranho e que parecem atingi-lo como por fatalidade. Tal, por exemplo, a perda de entes queridos e a dos que são o amparo da família. Tais ainda os acidentes que nenhuma previsão poderia impedir; os reveses da fortuna, que frustram todas as precauções aconselhadas pela prudência; os flagelos naturais, as enfermidades de nascença, sobretudo as que tiram a tantos infelizes os meios de ganhar a vida pelo trabalho; as deformidades, a idiotia, o cretinismo etc.

“Os que nascem nessas condições, certamente nada hão feito na existência atual para merecer, sem compensação, tão triste sorte que não podiam evitar, que são impotentes para mudar por si mesmos e que os põe à mercê da comiseração pública. Por que, pois, seres tão infelizes, enquanto, ao lado deles, sob o mesmo teto, na mesma família, outros são favorecidos de todos os modos?

“Que dizer, enfim, dessas crianças que morrem em tenra idade e da vida só conheceram sofrimentos? Problemas são esses que ainda nenhuma filosofia pode resolver, anomalias que nenhuma religião pode justificar e que seriam a negação da bondade, da justiça e da providência de Deus, se se verificasse a hipótese de ser criada a alma ao mesmo tempo em que o corpo e de estar a sua sorte irrevogavelmente determinada após a permanência de alguns instantes na Terra. Que fizeram essas almas, que acabam de sair das mãos do Criador, para se verem, neste mundo, a braços com tantas misérias e para merecerem no futuro uma recompensa ou uma punição qualquer, visto que não hão podido praticar nem o bem, nem o mal?

“Todavia, em virtude do axioma segundo o qual todo efeito tem uma causa, tais misérias são efeitos que hão de ter uma causa e, desde que se admita um Deus justo, essa causa também há de ser justa. Ora, ao efeito precedendo sempre a causa, se esta não se encontra na vida atual, há de ser anterior a essa vida, isto é, há de estar numa existência precedente. Por ouro lado, não podendo Deus punir alguém pelo bem que fez, nem pelo mal que não fez, se somos punidos, é porque fizemos o mal; se esse mal não o fizemos na presente vida, tê-lo-emos feito noutra. É uma alternativa a que ninguém pode fugir e em que a lógica decide de que parte se acha a justiça de Deus.

“O homem nem sempre é punido, ou punido completamente, na sua existência atual; mas não escapa nunca às conseqüências de suas faltas. A prosperidade do mau é apenas momentânea: se ele não expiar hoje, expiará amanhã, ao passo que aquele que sofre está expiando o seu passado. O infortúnio que, à primeira vista, parece imerecido tem sua razão de ser, e aquele que se encontra em sofrimento pode sempre dizer: Perdoa-me Senhor, porque pequei”.


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