sábado, 9 de agosto de 2014

Causas das Aflições

Causas das Aflições


João Paulo Bittencourt Cardozo

O Mestre Jesus, em suas andanças pela Terra, certa vez disse "bem-aventurados os que choram, pois que serão consolados" (S. Mateus, cap. V, v. 5). Quando refletimos sobre nossas vidas, e constatamos a quantos sofrimentos estamos sujeitos, e o quanto padecem as pessoas em geral, inevitavelmente perguntamo-nos: por que tudo isso? Há alguma utilidade nas aflições? A resposta à primeira pergunta é: sofremos por conseqüência de nossos próprios atos. A resposta à segunda já nos deu o próprio Cristo: as aflições vêm para o nosso crescimento e, assim, para o nosso bem.

O Dicionário Aurélio define aflição como agonia, atribulação, angústia, sofrimento. Sob certo ponto de vista, é tristeza, mágoa, dor ou, ainda, preocupação, inquietação.

Nossa dificuldade em compreender as aflições deriva de nossa dificuldade de compreender Deus. As pessoas normalmente fazem-Lhe idéia errada, imaginando-o como um bom velhinho de barbas brancas, sentado num trono celestial. Isso decorre, entretanto, da tendência que temos de definir aquilo que não conhecemos com uma imagem humana, que é algo que conhecemos. Sabemos que fomos criados à imagem e semelhança de Deus, mas não no corpo, e sim em espírito, como uma essência inteligente.

Na questão nº 1 de "O Livro dos Espíritos", perguntou Allan Kardec aos Espíritos Superiores "que é Deus", tendo eles respondido "Deus é a inteligência suprema, causa primária de todas as coisas". No atual estágio evolutivo da Humanidade, ainda primitivo e mais próximo do homem das cavernas que do anjo, não temos condições de ter uma compreensão exata de Deus. No entanto, algumas de suas características já são de nosso conhecimento, pois o sabemos imutável, imaterial, único, onipotente e, acima de tudo, soberanamente justo e bom. A razão é que nos demonstra, pois, se deixasse de ter qualquer uma destas características, já não mais seria Deus.

Com isso começamos a entender o porquê das aflições: se Deus é soberanamente justo, toda aflição, todo sofrimento que temos é justo, pois só o temos porque Ele permite. Se Deus é soberanamente bom, não sofremos porque Ele o quer, mas sim como conseqüência dos nossos próprios atos.

É exatamente esta a explicação que nos dá a Doutrina Espírita em dois de seus postulados básicos, a lei de causa e efeito e a reencarnação. A lei da física segundo a qual toda ação gera uma reação de idêntica potência tem uma aplicação em nossas vidas e em nossos atos maior do que imaginamos. Sempre que praticamos atos maus, prejudicando nossos semelhantes, produzimos sobre nós os mesmos efeitos, assim também quando falamos ou simplesmente pensamos o mal. Mas – aí o aspecto positivo –, tudo o que fizermos de bom, que seja benéfico às outras pessoas, a nós retorna com as mesmas características.

A reencarnação é uma conseqüência necessária da soberana justiça e bondade de Deus. Não fosse por ela, como explicar a existência de pessoas más que navegam no mar da vida sem qualquer atribulação, ao lado de pessoas boas, totalmente dedicadas ao próximo, que padecem os mais brutais sofrimentos? Mais do que isso, como entender a morte prematura de uma criança em tenra idade? É nas sucessivas reencarnações, em que progressivamente ocupamos os mais variados papéis no teatro do mundo, que a soberana justiça e bondade de Deus impõem as devidas compensações, fazendo-nos sofrer as conseqüências das ações más que porventura tenhamos praticado e, melhor do que isso, colher os frutos de nossas boas obras.

Desse modo, se sofremos é porque, em nossas próprias ações, infringimos as leis divinas ou naturais, bem sintetizadas por Jesus Cristo ao nos recomendar amar ao nosso próximo como a nós mesmos.

No entanto, não devemos acreditar que nossos sofrimentos atuais são decorrência pura e simplesmente de nossas encarnações passadas. Allan Kardec, no Capítulo V de "O Evangelho Segundo o Espiritismo", bem nos mostra que a quase totalidade de nossas dores são conseqüências de nossos atos nessa mesma encarnação em que ora transitamos (item 4). Pondera o Codificador, em diversos exemplos, quantos estão endividados porque não sabem viver com quanto ganham? Quantos os casamentos fracassados porque os cônjuges deixam de dialogar e se perdoar em acontecimentos insignificantes? Quantas doenças seriam evitadas se as pessoas não cometessem excessos de alimentação, ou se abandonassem vícios perniciosos como o álcool e o fumo? Quantos os filhos que seguem o caminho do vício porque os pais, no momento adequado, na infância, deixaram de lhes dar limites e os ensinar por bons exemplos?

Assim, se estamos sofrendo e olharmos com honestidade para dentro de nós mesmos, certamente constataremos que a causa desse sofrimento está em ações passadas por nós praticadas, quase sempre na atual encarnação.

Isso, entretanto, não significa que devemos simplesmente nos deixar sofrer sem nada fazer por nosso bem estar.

A dor física nos mostra que algo não está bem em nossa saúde: procuramos o médico, fazemos o tratamento adequado e recompomos o nosso bem estar. A aflição, a seu turno, demonstra-nos que estamos tomando caminhos errados em nossa vida e que temos que corrigir o curso.

A aflição, o sofrimento são como o despertador na madrugada: serve apenas para nos acordar, logo após o desligamos. Assim como não há quem deixe o despertador ligado o dia inteiro, devemos simplesmente "acordar" diante do sofrimento e, sem seguida, fazer o que seja necessário para "desligá-lo", corrigindo as ações equivocadas que nos fazem sofrer.

E a Doutrina Espírita está aí, justamente, para nos auxiliar a descobrir o que está errado em nossa vida e a retomar o correto caminho. Para nos lembrar que todos os recursos da Espiritualidade Superior estão à disposição de todos nós. Os bons espíritos sempre tentam nos influenciar para o bem, nós é que os impedimos quando nos fixamos em aspectos negativos, como egoísmo, orgulho, medo, raiva, rancor.

É urgente, portanto, que olhemos para dentro de nós mesmos e reflitamos sobre por que estamos sofrendo, a fim de mudar de atitude, aproveitando o que de bom nos proporciona a Doutrina Espírita em matéria de reflexão e oportunidades de praticar o bem, tornando-nos felizes pura e simplesmente por estarmos cumprindo a lei maior que nos recomenda fazer ao próximo o que gostaríamos que a nós fosse feito.

Concluímos com Joanna de Ângelis em sua belíssima obra "Iluminação Interior" (psicografia de Divaldo Pereira Franco, cap. 18), ao nos dizer que não sofrer é uma pretensão utópica no atual estágio de evolução da Humanidade. No entanto, muitos sofrimentos podem ser modificados se as pessoas compreenderem por que eles existem e alterarem sua conduta diante deles, dispondo-se à renovação, pois a felicidade "não é ausência de dor, mas a perfeita compreensão da sua finalidade".

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