quarta-feira, 26 de setembro de 2012

PAO E LUZ


PAO E LUZ

          Não só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus - disse Jesus. Essa palavra é a luz, é a verdade.
          A luz é para o Espírito, o que o pão é para ocorpo. O homem, em sua expressão real, não se confina exclusivamente na carne e no sangue: o homem é uma alma encarnada. Se, pois, o pão é indispensável à vida corpórea, a luz é imprescindível à vida espiritual, considerando que esta é a vida real que sobre aquela reflete. Dai o ser a mais importante, a que requer mais atenção e cuidados. Cumpre, portanto, que o homem não porfie e lute somente pelo pão que nutre o corpo perecível, mas também, e principalmente, pela aquisição da luz que alimenta e dá crescimento ao Espírito imortal. O homem sendo, como ficou dito, uma entidade composta de alma e corpo, não pode, por isso, atender aos reclamos da vida, mantendo-se adstrito ao problema do pão.
          Pelo pão, no entanto, todos porfiam e batem-se com denodo e tenacidade. Pela luz, porém, não fazem o mesmo. Quem carece de pão, protesta desde logo e poe-se em atividade, lançando mão de todos os meios e processos, lícitos ou ilícitos, para adquiri-lo. Aqueles que se acham na escuridão, nela permanecem, á míngua de luz, agitando-se no meio da confusão e da incompreensão dos problemas que o afetam. A luz não lhes interessa como o pão interessa ao faminto; por isso, este, quando não pode exigir, pede e implora o pão, enquanto que aquele menospreza e desdenha a luz cujo valor desconhece. O faminto sabe e sente que lhe falta o pão. O ignorante presume que tem luz e, por isso, não a deseja e nem a procura. O faminto esta certo e convencido de que sem o pão não pode viver, ao passo que o ignaro não concebe opapel que a luz representa na trama da vida eterna do Espírito.
          A fome do pão para a boca produz efeitos imediatos, que o faminto busca logo remediar ou prevenir. As funestas e desastrosas conseqüências da ignorância da verdade são complexas, e, por vezes, remotas, de modo que as suas vitimas não estabelecem nenhuma relação entre a causa e seus efeitos.
          Não e necessário advertir o faminto que ele necessita de pão. No entanto, é mister muito esforço, paciência, engenho e arte para convencer o ignorante de que ele tem necessidade de luz. Qualquer pode distribuir pão. Poucos, porém, estão em condições de espalhar e difundir a luz. O pão é ardentemente desejado pelo faminto, enquanto que o inciente rejeita e repele a luz oferecida.
          O Despenseiro das divinas claridades assim se pronunciou a propósito deste assunto: "Aquele que não crê em mim já esta condenado e a condenação é esta: a luz foi-lhes ofertada e eles a recusaram."
          Ora quem rejeita a luz esta, realmente, condenado a permanecer em trevas, suportando os reveses e acidentes que decorrem dessa situação.
          Se o ignorante sentisse fome de luz, como o faminto sente fome de pão, já não haveria consciências embotadas e corações insensíveis ao bem; o mundo já seria luminoso. Mas, são tão raros os que percebem e confessam achar-se sob o império dessa espécie de fome, que Jesus os classificou, como aos humildes, no número dos venturosos, dignos da graça divina dizendo: Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão fartos. No entanto se são muitos os que carecem de pão, maior, muito maior é ainda o número dos que perecem à míngua de luz, visto como, nesta rubrica, pode-se computar quase a humanidade inteira conforme atestam o confusionismo e o estado caótico em que mundo de nossos dias se debate.
          A propósito de tão magno assunto, vamos rememorar aqui, as seguintes estrofes do imortal vate lusitano, Guerra Junqueiro:
          - Acendem-se na rua, à noite, os candeeiros;
          Coloca-se um gendarme à porta dos banqueiros;
          A policia fareja os becos e as vielas;
          Dobram-se as precauções, dobram-se as sentinelas;
          E apesar disto tudo há feras pela rua;
          O vicio não acaba, o roubo continua,
          E é cada vez maior a criminalidade.
          Pois bem; iluminai por dentro a sociedade:
          Ponde o trabalho e a honra onde estiver a esmola;
          Uni o amor ao berço e uni o berço à escola.
          Acendei uma luz em cada coração.
          Tal é o remédio apontado pelo grande pensador, para debelar o crime e moralizar a sociedade. Realmente, não existe outra panacéia capaz de conjurar os vetustos e renitentes males sociais, senão essa. Tudo o mais são paliativos, são recursos efêmeros cujo efeito consiste em adiar as crises da enfermidade moral de que padecem os homens. E, assim, de delonga em delonga, de adiamento em adiamento, as doenças do Espírito se radicam e se agravam zombando do curandeirismo irracional e inócuo, contra elas aplicado.
          Dentre os graves estados mórbidos que nos ameaçam, esta a guerra, esse avejão sinistro, devorador de vidas humanas, devastador impenitente dos campos e cidades, anarquizador por excelência da ordem e do ritmo vital de povos e nações.
      o que se tem feito ate aqui para extinguir de vez a guerra, tornando-a impraticável?
          De prático e eficiente, nada.
          Diviniza-se a paz, porem, somente nos lábios, nas frases literárias, nos discursos políticos mais ou menos demagógicos.
          A Guerra, como, alias, também a Paz, resultam das conseqüências, inelutáveis e fatais da condição em que se acham estruturadas as organizações político-sociais do nosso mundo. Enquanto estas forem iníquas, prevalecendo a força contra o direito, e a impostura contra a verdade, haverá inevitavelmente guerras e convulsões sangrentas.
          A paz custa um certo preço. Sem o pagarmos, jamais a teremos. E, sabeis qual e oseu preço?
          Eu vo-lo digo sem receio de contestação. Eu, pobre pária, vos afirmo, desafiando a contradita de todos os magnatas da Política - de ontem, de hoje e de amanhã: o preço da paz é a justiça, aquela Justiça, porém, da qual disse o Mestre de Nazaré aos seus discípulos: Se a vossa justiça não for superior a dos escribas e fariseus, não entrareis no reino de Deus. Sem ela, nunca sairemos das garras aduncas e ferozes, das guerras periódicas desencadeadas em determinadas regiões do planeta, evoluindo para as grandes conflagrações, como as que tivemos ultimamente.
          Em tempos bem longínquos, disse, sentenciosamente, o padre Antonio Vieira em um dos seus celebres sermões: "Abraçavam-se a justiça e a paz, e foi a justiça a primeira que concorreu para esse abraço "Justitia e Pax", porque a justiça não é a que depende da paz, senão a paz que depende da justiça."
          Esta frase memorável foi proferida há perto de 300 anos. Encerrando, porém, uma evidencia, ela é oportuna hoje como outrora. Passarão, sentenciou o Verbo Divino, os céus e a Terra, mas minhas palavras permanecerão. Sim, permanecerão por certo porque a Verdade é a mesma em todas as épocas da humanidade; e a verdade, acerca do velho e debatido problema da paz, e essa. Não existe outra.
          Justiça, portanto, é também um gênero de pão imprescindível à vida espiritual.
          E, como havemos de incutir as noções de justiça nos Espíritos aqui encarnados?
          Respondo, também sem hesitar: pela Educação; será tão-somente pela educação dos sentimentos, por isso que, o senso de justiça, como, alias, de todas as virtudes, nasce, cresce e frutifica no coração e não no cérebro.
          Educar, formando ocaráter, eis o problema máximo cuja solução o momento reclama angustiosamente.
          Portanto, repetimos: Ou o Espiritismo enfrenta corajosamente a questão educacional, concentrando nela as suas energias, ou terá falhado aquela finalidade que o Alto lhe assinalou

Autor: Pedro de Camargo

Fonte: O Mestre na Educação

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