sexta-feira, 27 de agosto de 2010

A Cura do Criado do Centurião.

Amílcar Del Chiaro Filho

 

Mateus 8: 5 – 13 e Lucas 7: 2 – 10. Esta é uma passagem muito interessante, porque um centurião – portanto soldado romano que comandava uma centúria ou tropa de 100 soldados, procura Jesus e pede para que o Mestre cure o seu criado, que jazia em casa paralítico. Jesus se propõem a ir a sua casa para curá-lo, e o centurião respondeu: Senhor, eu não sou digno de que entres em minha casa, mas fala somente ao verbo e meu criado há de sarar. Porque também sou homem sujeito a autoridade e tenho soldados às minhas ordens. E digo a este, vai lá, e ele vai; e a outro, vem cá, e ele vem; e a meu servo, faze isto, e ele faz. (tradução de Torres Pastorino). Jesus ficou muito admirado e disse: Em verdade vos afirmo que nem mesmo em Israel encontrei tão grande fé.
Nossa preocupação não é a de examinar os processos de cura, pois os espíritas conhecem muito bem a atuação dos fluidos para que a cura aconteça. Queremos destacar, sim, a ação benemérita daquele soldado para com o seu criado. Ele era benquisto pela sociedade local, pois até mandou erigir uma Sinagoga na cidade de Cafarnaum.
O cuidado do centurião era, também, por saber que as complicadas leis judaicas de pureza, obrigaria Jesus a se purificar no Templo, após ter estado em sua casa. (Jesus estava acima desses preconceitos religiosos). Contudo, o admirável nesta passagem é o conhecimento superior do Centurião. Pastorino acredita, com certeza, que ele tinha conhecimento da gnose” e das Doutrinas de Alexandria. O soldado romano sabia que no mundo dos espíritos as inteligências superiores estavam a serviço do Cristo. Ele sabia, que mesmo à distância, Jesus poderia movimentar as forças da natureza e curar o homem doente, que estava sofrendo muito.
Nem mesmo em Israel, isto é, entre os judeus, encontrei tamanha fé, admirou-se Jesus. É interessante que um gentio, um goin, deu prova de uma fé tão grande que ficou registrado nos Evangelhos e na história. Sua palavras tem sido repetidas milhões de vezes no mundo cristão.
Malba Tahan, um dos mais extraordinários contistas da nossa literatura, conta uma história muito interessante a respeito desta passagem:
Um homem romano, na cidade dos Césares, havia caído da sua posição de privilegiada e agora morava num populoso bairro pobre, onde era muito amigo de todos e ajudava todos que necessitavam. Ele tinha dois filhos, e um deles era poeta e vivia no palácio imperial. O outro era soldado, e isto dava uma grande tristeza ao seu pai, que não queria um filho soldado. Um dia este filho partiu com um destacamento para uma terra distante.
Um dia este homem viu um soldado agredindo um menino e partiu em defesa do garoto. O soldado deu-lhe um forte golpe com o punho do gládio na cabeça, e o homem caiu semimorto. Os anjos vieram buscá-lo, mas como ele estava muito preocupado com um dos filhos, os anjos disseram a ele que a humanidade cantaria os versos do seu filho nos séculos vindouros. Feliz, ele imaginou a glória do seu filho poeta através dos tempos, e pediu para testemunhar essa glória. Insistiu tanto que uma ordem superior determinou que o levassem ao futuro para ouvir os versos do seu filho.
O tempo avançou quase dois milênios e os dois anjos entraram com o homem numa grande catedral cristã, onde o Coro cantava gloriosamente: Senhor, eu não sou digno que entre em minha casa, mas diga uma só palavra e meu criado será salvo.
As passagens que trata de ressurreição, como a de Lázaro, do filho da viúva de Naim e a menina filha de Jairo, não vamos comentar, porque é de entendimento do Espiritismo, que não aconteceu ressucitação, pois, Se houver o desligamento dos laços que prende o espírito ao corpo, não há como reatá-lo. O que aconteceu foi a morte aparente, através da catalepsia, e que a força magnética de Jesus, despertou.
Em Mateus 13:1 – 9 — Marcos 4: 1-9 e Lucas 8:4-8 vem narrada a Parábola do Semeador. Como ela é simples ao entendimento, por não vamos nos aprofundar nela, mas como Jesus explicou-a separadamente aos discípulos, fica uma confirmação, ao menos aparente, de que Jesus de Nazaré tinha uma doutrina oculta, reservada aos discípulos.
Jesus disse que aos discípulos era dado conhecer os mistérios do Reino dos Céus, mas aos outros não. Isto não pode ser entendido como preferência, mas como capacidade de entender.
Repetimos o que já falamos outras vezes: se hoje não mais existem os mistérios, as iniciações formais, persiste uma seleção natural pela medida da compreensão de cada um.
A Parábola do tesouro oculto é privativa de Mateus, e está no capítulo 13:44-53. Jesus contou que um homem encontrou um tesouro num campo e vendeu tudo o que possuía para adquirir aquele campo e tomar posse do tesouro. Depois ele conta a parábola do mercador de pérolas e da seleção de peixes. Em cada uma delas o personagem se desfaz de posses ou coisas menores para ficar com algo mais valioso.
Quando descobrimos a verdade, desfazemo-nos das pequenas ou meias verdades para ficar com a verdade inteira. Podemos dizer que desfazemo-nos das nossas crenças, superstições ou religiões, para aceitar uma Doutrina filosófica com conseqüências morais e religiosas, o Espiritismo.
Em Mateus 8:18 e 23 –27 — Marcos 4:35-41 e Lucas 8:22-25 contam que Jesus atravessa o lago de Genezaré, ou Mar de Tiberíades, num barco, juntamente com os discípulos, e provavelmente de propriedade de Pedro. Cansado, o Mestre dormiu, Subitamente se desencadeou um fenômeno comum na região; correntes fortes de ventos provoca agitação violenta nas águas, levantando grandes ondas e enorme sorvedouros no Tiberíades. As correntes de vento se originam do Vale do Jordão e são imprevisíveis.
Os discípulos ficaram muito assustados, porque a tempestade deveria ser muito violenta, pois eles estavam acostumados a enfrentar o mal tempo, e foram acordar Jesus que repreende os ventos e ordena ao mar amordaçar-se e de imediato houve uma grande calmaria, o que também assustou os discípulos.
Para o episódio há duas interpretações. Uma objetiva, embora um tanto fantástica e misteriosa, e a outra subjetiva, interpretativa.
Na primeira, Jesus com a sua extraordinária evolução, ordena à natureza que obedece e se acalma. — No Livro dos Espíritos há a revelação de que os fenômenos da natureza são executados por legiões de espíritos pré-humanos, dirigidos por outros mais adiantados. Isto, de certa forma, facilitaria o entendimento da pronta obediência. Uma inteligência infinitamente superior ordena e as inteligências embrionárias são forçadas a obedecer.
A outra interpretação se passa no íntimo do homem. A tempestade se dá dentro, no mundo interior do homem. São os jogos da paixão, os desejos, os conflitos que ameaçam fazer o homem moral naufragar. Apelamos, então, para um ser superior, ou para o Cristo interno que dormita ainda dentro de nós, e ele acalma nossas paixões, tranqüiliza a nossa mente, faz cessar a tempestade.
Podemos interpretar, também, como o homem superior, cósmico, que atravessa o mar revolto da vida, sem medos ou intranqüilidade e faz com que os ventos e o mar se acalmem. Isto quer dizer que nem as tempestades exteriores, nem as interiores o abalam. É o homem que venceu a morte, porque sabe que é imortal.
Repetimos que a nossa intenção não é a de examinar os Evangelhos passo a passo, e sim, abordar alguns ensinamentos e dar-lhes uma interpretação mais racional pelo prisma do nosso entendimento. Sei que os leitores dessas páginas poderão achar que passagens que ficaram fora são mais importantes do que algumas que colocamos. Em Mateus 10:34-39 e Lucas 12:49-53 Jesus fala energicamente. Temos a impressão que as palavras que se seguem não poderia ser de Jesus, mas se encaixaria perfeitamente em Kardec – O Evangelho Segundo o Espiritismo — Moral Estranha —. Jesus diz claramente que não veio trazer a paz a Terra, mas sim a espada. Afirma, também, que veio por fogo à Terra. Disse que veio colocar o pai contra o filho, a sogra contra a nora.
Mesmo sendo palavras chocantes não é difícil de entender que numa mesma família pode ter um ou dois que aceite o Cristo e outros que não aceitam. Muitos espíritas conhecem essa experiência, pois, não raro, sua família não aceita o Espiritismo. Além do preconceito, quase sempre as coisas ruins que acontecerem com a família é creditado ao fato daquele membro que vai a centros espíritas e traz influências ruins para dentro de casa.
Vamos examinar a interpretação esotérica (fechada) de Torres Pastorino, que é muito bela: ele coloca que os nossos domésticos são partes de nós mesmos. Quanto ao fogo, ele afirma ser o espírito que anima o corpo. Vamos à narrativa de Pastorino:
O pai (espírito) quer se impor ao filho (emoções), mas essa se opõem a ele. A mãe (inteligência), quer superar a filha (a carne), mas essa rebela-se, e vencendo-a com o sono, cansaço e etc. A sogra (ainda inteligência), busca dominar a nora (sensações físicas), mas essas são poderosas.
Pastorino comenta como é difícil para a inteligência desarraigar vícios como bebida, tabaco, gula, preguiça... ou os obstáculos, como o cansaço, ou ainda as emoções violentas, como a cólera, o ciúme...
Em relação ao que Jesus falou que devíamos amá-lo mais que aos nossos pais, Pastorino usa um vocábulo grego que significa afeição respeitosa dirigida a um benfeitor, e não um outro vocábulo com o significado de amor terno e instintivo. Segundo Pastorino era costume entre os Israelitas daquela época, o Mestre ser colocado antes do pai. Ele cita uma frase ensinada por um tratado judeu: o pai nos colocou neste mundo, mas o Mestre, que nos ensina a sabedoria, nos dá a vida do outro mundo.
Huberto Rohden faz uma belíssima dissertação sobre o assunto e começa dizendo que a Doutrina do Cristo é fogo ardente. Fogo é luz, calor, energia. Luz simboliza sabedoria. Calor simboliza amor, simpatia, entusiasmo. Energia é a realização da verdade e do amor.
Rohden explica que tudo o que existe é luz. Os 92 elementos do sistema periódico da química, são 92 manifestações variadas da mesma luz. O autor da Gênese sabia isto intuitivamente quando escreveu: no primeiro dia Deus criou a luz. Desta luz, segundo Moisés e Einsten, nasceram todas as coisas. A matéria é energia congelada e as energias são luz condensada. Quanto mais condensada uma coisa, tanto menos material. A luz possui condensação mínima, e por isto, expansão máxima. A luz tem onipresença. Tudo é feito dela. A luz é a menos material de todas as coisas materiais, por isso é o que melhor simboliza a Divindade.
Quando Jesus diz que veio lançar fogo a Terra, veio lançar luz, isto é, veio permear do espírito de Deus todas as coisas do mundo de Deus. Todos nós temos, potencialmente, este fogo do Cristo, mas não basta tê-lo, é preciso que ele arda, que se atualize, que se torne consciente, que permeie nossa vida.
Uma alma possuidora desse fogo, pode incendiar outras almas que tenham o combustível. As cinco virgens tolas não puderam ter suas lâmpadas acesas porque não tinham o azeite, estavam vazias. (ver parábola).
Del Chiaro faz um pequeno comentário com relação a Doutrina Espírita. Somos potencialmente perfeitos. Somos luz, embora de pouca expansão. Se a Doutrina Espírita acender em nosso íntimo o combustível do amor, da verdade, da justiça, atualizaremos as nossas potencialidades, deixaremos de ser promessa, para ser realidade. Para isso é preciso entusiasmo, que significa Deus dentro de si.

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